PRISÕES NO BRASIL: MEMÓRIAS DE DISCIPLINA OU DE DESPEJO?

Publicado em 14/03/2022 - ISSN: 2316-266X

Título do Trabalho
PRISÕES NO BRASIL: MEMÓRIAS DE DISCIPLINA OU DE DESPEJO?
Autores
  • Fernanda Santos Curcio
  • Lobelia da Silva Faceira
Modalidade
Comunicação Oral - Resumo
Área temática
[GT 07] Educação Memória História
Data de Publicação
14/03/2022
País da Publicação
Brasil
Idioma da Publicação
Português
Página do Trabalho
https://www.even3.com.br/anais/viiconinter2018/109461-prisoes-no-brasil--memorias-de-disciplina-ou-de-despejo
ISSN
2316-266X
Palavras-Chave
Prisão, Brasil, Memória
Resumo
Objetivamos neste trabalho, utilizando como abordagem metodológica a pesquisa bibliográfica, compreender e refletir sobre o surgimento da prisão no Brasil, colocando em questão importantes obras que tratam desde fenômeno no mundo ocidental. Partimos do entendimento que pensar o universo prisional requer considerar a conjuntura econômica, social, política e cultural que edificam o seu ordenamento, as suas nuances e peculiaridades que darão tom à prática punitiva. Autores como Foucault (1987), Ignatieff (1978), Melossi e Pavarini (1981) são intensamente utilizados por trabalhos que se dedicam a tratar da instituição prisional em contexto brasileiro. Compreendemos ser muito instrutiva a leitura de tais obras, uma vez que – ainda que toda analogia seja de natureza imperfeita – as mesmas nos auxiliam a dar os primeiros passos descortinamento do cenário ora estudado. Afinal, para cada objeto de estudo, em algum momento, há obras que são incontornáveis, porém ressaltamos que: “a questão não é dela se servir, mas servir-se sem ser servil” . A prisão, como qualquer outra instituição, é concebida a partir do contexto social-histórico em que faz parte. As memórias que percorrem a vida social, num determinado lugar e tempo atravessam, também, as instituições que a fundamentam. O cárcere não se fez e se manteve descolado dessas nuances. Refletir sobre a institucionalização da prisão requer pensarmos a trajetória sociopolítica, o padrão de desenvolvimento econômico e a estrutura étnico-racial que entoam o cenário nacional. Pensar o encarceramento na América Latina importa concebê-los como produtos das modificações na adaptação dos sistemas estrangeiros, no desenvolvimento das discussões políticas e ideológicas, e por fim, nas manifestações subalternas de ação e resistência que se desenrolam no cenário estudado. O que notamos é uma verdadeira dissenção nas alterações nas concepções de punir dos países europeus e no Brasil no desfecho do século XVIII. Ocorre que “enquanto o Velho Mundo assistia ao fim dos suplícios [...], na sociedade escravista brasileira não só permaneciam os castigos corporais, como também eram acirrados. No limiar dos anos 1800 o aumento da utilização de penas corporais crescia ao lado do aumento exponencial da população escrava. Aqui, a execução pública das penas prescritas ao delinquente – principalmente o escravo – fazia parte do cenário urbano colonial. Com o aumento progressivo das cidades e da população não existiam espaços suficientes para os variados tipos de delinquentes crescentemente aprisionados. A superpopulação carcerária, de acordo com Araújo (2009), já se colocava como um transtorno que assolava a colônia no desenlace do século XVIII. Problema este que irá se alastrar ao longo de toda a história brasileira. Com a Independência a realidade não se transformara. Havia sim alguns movimentos de crítica às condições das carceragens, que evidenciavam os horrores do colonialismo, fazendo repercutir as reformas penais em desenvolvimento na Europa. Mas, tais discursos não eram abarcados efetivamente pelos dirigentes políticos pós-independência. No início do século XIX países da Europa e Estados Unidos adotam o modelo penitenciário como paradigma institucional carcerário por excelência. Este conjuga o desenho arquitetônico, a rotina intensamente regulada pelo trabalho e instrução, a estrutura de vigilância constante sobre os aprisionados, o procedimento teoricamente humanitário e o ensino religioso. Mesmo não atingindo grandes proporções nos países latino-americanos, tal modelo ganhou atenção de algumas autoridades que aspiravam reproduzir os protótipos sociais europeus e norte-americanos. Aguirre (2009) ressalta que tal movimento é uma tentativa de aderir a “modernidade” e utilizar instrumentos de controle “exitosos” sobre as populações indisciplinadas. Os Estados, não obstante, não apresentavam o intuito de empregar o dinheiro público e capital político na edificação de espaços que acreditavam não ser mais eficientes que os modos convencionais e informais de castigo largamente empregados naquele momento histórico. Ainda que diante de tais limites, a partir de meados do século XIX são erguidas algumas instituições penitenciárias modernas no continente. Os objetivos para tais obras estavam entorno da ampliação do controle do Estado, da construção de uma imagem de modernidade; do processo de banimento de certos métodos sórdidos de castigo; da promoção do sentimento de segurança para as elites urbanas; da transformação dos bandidos em cidadãos que respeitam as leis. Contudo, como destaca Aguirre (2009), foi a exceção dentro de um cenário em que o padrão convergia em dispositivos de controle e castigo em espaços periféricos, caóticos e desumanos. O latifúndio escravista introduzido no século XVI marcará com profundidade o desenvolvimento histórico-social do Brasil. Os elementos específicos produzidos por uma sociedade latifundiária e escravista extrapolam a estrutura produtiva e invadem os mecanismos de reprodução social, inserindo-se nos variados espaços da vida social: instituições e relações. Nas últimas décadas do século XIX novas doutrinas penais e criminológicas, já debatidas pelas metrópoles ocidentais, ganham espaço nos países de América Latina. Os debates sobre o aprisionamento se intensificam, porém, as mudanças na prática foram insuficientes. Mais uma vez o moderno e o arcaico coadunam-se. A introdução da pena de prisão no Brasil, diferentemente da Europa, não estava coadunada à extensão de direitos e garantias individuais pregadas pelas revoluções burguesas da modernidade, como acredita Salla (1999). Diante da pesquisa bibliográfica realizada, verificamos que a racionalidade liberal criminal que se desenvolveu no país entre os séculos XVIII e XIX, traz a pena de prisão ao lado das arcaicas penas (de morte, galés, açoites). Na verdade, a prisão funcionava como um instrumento de conservação da estrutura social ancorada na escravidão, no latifúndio e na pobreza. O espaço penitenciário marcou a homologação de uma ordem política excludente e violenta, em que a massa indisciplinada se colocou como seu sustentáculo. A preocupação em buscar alternativas a este tratamento não se dá – ao menos primordialmente – com a perspectiva humanitária. Foi diante do declínio da escravidão, da punição privada e dos empecilhos colocados ao controle da delinquência, que o Estado se vê obrigado a pensar outras formas de atuação. Além disso, as mudanças ocorridas levam, não a extinção da degradação e tormento físico do delinquente, mas, apenas o ocultamento do suplício em sessões privadas, em quantidades um pouco moderadas, por dentro dos muros da prisão. Qualquer similaridade com o sistema penal brasileiro na atualidade não é mera coincidência.
Título do Evento
VII Coninter
Cidade do Evento
Rio de Janeiro
Título dos Anais do Evento
Anais VII CONINTER
Nome da Editora
Even3
Meio de Divulgação
Meio Digital

Como citar

CURCIO, Fernanda Santos; FACEIRA, Lobelia da Silva. PRISÕES NO BRASIL: MEMÓRIAS DE DISCIPLINA OU DE DESPEJO?.. In: Anais VII CONINTER. Anais...Rio de Janeiro(RJ) UNIRIO, 2018. Disponível em: https//www.even3.com.br/anais/VIIConinter2018/109461-PRISOES-NO-BRASIL--MEMORIAS-DE-DISCIPLINA-OU-DE-DESPEJO. Acesso em: 26/04/2025

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