A SAÚDE DA MULHER NEGRA BRASILEIRA: DAS INTERSECCIONALIDADES DE GÊNERO E RAÇA

Publicado em 23/12/2021

Título do Trabalho
A SAÚDE DA MULHER NEGRA BRASILEIRA: DAS INTERSECCIONALIDADES DE GÊNERO E RAÇA
Autores
  • Cristiane Cordeiro da Silva Delfino
Modalidade
Resumo Expandido e Trabalho Completo
Área temática
GT 22 - Estudos de gênero, feminismos e interdisciplinaridade.
Data de Publicação
23/12/2021
País da Publicação
Brasil
Idioma da Publicação
Português
Página do Trabalho
https://www.even3.com.br/anais/xc22021/412586-a-saude-da-mulher-negra-brasileira--das-interseccionalidades-de-genero-e-raca
ISSN
Palavras-Chave
Gênero, raça, interseccionalidade, saúde da mulher negra.
Resumo
Introdução Este estudo visa destacar a importância de refletir acerca da relação interseccional de gênero e raça na atenção à saúde da mulher brasileira, cotejando as narrativas da Política Nacional de Saúde Integral da População Negra – PNSIPN. Nesta direção, explicitamos que o campo da saúde é um campo fértil de produção e reprodução de estereótipos acerca da saúde das mulheres, principalmente no âmbito da sexualidade e reprodução humana. Reconhecer esse processo e refletir acerca deste faz-se um movimento de suma importância, em uma sociedade dita moderna que resguarda valores de base machista, patriarcal e racista. Assim, para melhor compreensão acerca da temática dividiremos este estudo em dois momentos. Em um primeiro momento refletiremos sobre o “racismo à brasileira” e a interseccionalidade de gênero e raça nesse processo. E, em um segundo momento dissertaremos acerca da saúde da mulher negra tendo por base a análise da PNSIPN. Para alcançarmos os objetivos elencados utilizaremos como método de pesquisa a revisão bibliográfica e a análise do desenho da PNSIPN. 1. Fundamentação teórica Iniciamos nossas reflexões destacando que o corpo como uma construção social é atravessado por múltiplos discursos. Vencer os “regimes da verdade” que marcam determinadas formas de ser mulher é vencer a dinâmica biológica do corpo, é pensar a saúde da mulher para além da gestação, útero e mama. É pensar a diversidade do que é ser mulher: branca, negra, indígena, lésbica, deficiente, rica, pobre, ou seja, o diverso da “sujeita mulher”. A análise da história da mulher deve ultrapassar a “mulher universal”, pois não existe maior privilégio que ser a regra, que representar a “normalidade” em detrimento do “diferente”. Werneck (2000, p.9) salienta que “não somos todas iguais, nem somos completamente diferentes”. Busca-se nessa afirmativa explicitar a humanidade e a similitude na multiplicidade do que é ser mulher. Pensar as especificidades que atingem as mulheres é pensar na dinâmica do corpo e os papéis atribuídos a este. Almeida (2011, p.5) aponta que “é no campo da saúde que se forjam e sustentam os laços naturais entre identidade feminina/comportamentos e funções corporais, com destaque para os eventos em torno da reprodução”. O espaço da saúde concebe um ambiente de representação das desigualdades “naturais” no binômio feminino/masculino, perpassado pelo víeis de raça-etnia. Refletir acerca da saúde das mulheres, do ponto de vista feminista, é uma desobediência à ordem, é romper com a dinâmica do “universal” para pensar as especificidades. Em relação à saúde das mulheres negras, o Movimento das Mulheres Negras passou a explicitar suas demandas, principalmente nas questões de saúde sexual e reprodutiva. “As primeiras inserções do tema saúde da população negra nas ações governamentais, no âmbito estadual e municipal, ocorreram na década de 1980 e foram formuladas por ativistas do Movimento Social Negro e pesquisadores” (PNSIPN, 2009, p.10). Vale destacar a importância dos Movimentos sociais no processo de consolidação das lutas sociais. Nesta direção, para que nossas analises ultrapassem o “universal”, analisar o papel dos movimentos sociais, suas lutas e articulações faz-se movimento essencial. Pensar a ação dos movimentos e como eles interferem na explicitação de suas especificidades é atentar para as formas de subjetivação de práticas que se legitimam no cotidiano. Destacamos que a denúncia do racismo no Brasil, do mito da democracia racial emerge a partir da mobilização dos Movimentos Negros. Assim, refletindo acerca do Movimento Negro Hasenbalg aponta que este ressurge nos meados dos anos de 1970, com forte discurso marcado por radicalismo e contestação da ordem estabelecida e dos estereótipos e mitos raciais (HASENBALG, 1984). Em relação à população negra brasileira, cerca de metade é composta por mulheres. Estas sofrem o fenômeno da dupla discriminação, em uma conjugação perversa que oscila entre racismo e sexismo. Como aponta Collins ”eu vivo todos os dias como uma mulher afro-americana – uma experiência específica de raça/gênero. E não estou sozinha. Todas/os têm uma identidade específica de raça/gênero/classe” (COLLINS, 2015, p.17). E, não atentar para esse fato é cair em armadilhas conceituais. Essas opressões, em suas especificidades, podem ser mais ou menos latente em determinados momentos, e condicionado ao espaço que ocupamos. Nesta direção na analise das bandeiras dos movimentos, destacamos como aponta Carneiro (2003) fez-se necessário “ENEGRECER” Movimento Feminista e “SEXUALIZAR” o movimento negro, reconhecendo as “diferenças” dentro das “diferenças”, e/ou “igualdades” entre os sujeitos. Cabe aqui uma reflexão acerca de fato de que as leis, políticas e programas, em muitos casos, não apontam as demandas das mulheres explicitando a negritude dessa mulher, o que acarreta “novas” segregações, “novas” subordinações. 2. Resultados alcançados A partir da III Conferência Mundial contra o Racismo, Discriminação Racial, Xenofobia e Intolerância Correlata que o tema saúde da população negra passa ser alvo de reflexões na agenda governamental. Esse processo tem como marco a produção de um documento que trouxe o reconhecimento da ausência do debate da saúde da população negra no âmbito do Ministério da saúde. O Documento aponta a questão da saúde da população negra como uma “área de estudo inter e transdisciplinar, que se baseia em conhecimentos produzidos nas ciências humanas e nas ciências médicas” (OPAS, 2001, p.25). Vale ressaltar que este documento serviu como base para a construção da Política Nacional de Saúde Integral da População Negra/PNSIPN, em 2006, aprovada no Conselho Nacional de Saúde, apontando a responsabilidade do SUS na promoção de ações de atenção à saúde da população negra. Esse processo reconhece o racismo, como condição histórica, de segregação e agravamento das vulnerabilidades que a população negra está exposta (BRASIL, 2011). A questão do quesito cor passou a ser incorporado na década de 1990, importante instrumento para implementação de políticas específicas. ”Em atenção às reivindicações da marcha do Zumbi dos Palmares, realizada em 20 de novembro de 1995, o que resultou na criação do Grupo de Trabalho Interministerial para Valorização da População Negra (GTI) e do Subgrupo Saúde” (PNSIPN, 2009, p.10). Dessa forma, o quesito cor passa ser uma bandeira do Movimento negro, no processo de explicitação de suas especificidades. O não preenchimento desse quesito nas unidades de saúde, a ausência de variável de raça e cor tem dificultado uma análise mais aprofundada das desigualdades que atingem a saúde da mulher negra, com isso, as ausências de dados dificultam maior investimento nessa área. Traz, também, a dificuldade de monitoramento e avaliação da implementação da PNSIPN como instrumento de planejamento de gestão nas três esferas governamentais. Destacar essas “diferenças” é necessário para um atendimento equânime das demandas dos sujeitos. Assim sendo, tanto as questões de gênero como as raciais têm lidado com a diferença. O desafio é incorporar a questão de gênero à prática dos direitos humanos e a questão racial ao gênero. “[...] Um dos problemas é que as visões de discriminação racial e de gênero partem do princípio de que estamos falando de categorias diferentes de pessoas” (CRENSHAW, 2004, p.9). Diante das reflexões tecidas aponta-se que o racismo enquanto ideologia dominante abarca todas as práticas sociais, de modo inclusivo as práticas de saúde. O processo de estereotipação da população negra, do não reconhecimento, por parte dos profissionais, da necessidade de explicitação das especificidades no âmbito da política de saúde, escassas produções técnico-científica, adensam as desigualdades e disparidades no atendimento a esta população. Este conjunto de violações aponta para novas lutas e constante resistências. Partimos do entendimento, de acordo com a política, dessas diferenças como forma de proporcionar equidade e não discriminação e desigualdades nos atendimentos. Para que se tenha uma política específica para os “diferentes” necessitamos “diferenciá-los” para um atendimento equânime, esta fora uma das estratégias encontradas pelos formuladores da PNSIPN. Não sem ressalvas, assim como se dá o caso da classificação racial no Brasil, da determinação de quem é negro no Brasil. Conclusões Assim, apontamos que os discursos presentes nas políticas públicas em saúde como um campo de produção de sujeitos que se articulam a novos aspectos interseccional, constituindo distintos modos de subjetivação dos indivíduos envolvidos. Discursos são práticas que constroem sujeitos, corpos e formas de existência. Ao analisarmos os discursos sobre saúde da mulher, devemos nos atentar para o fato de que a dinâmica desta constituição envolve questões relacionais de gênero e raça, como também, posicionamento dos documentos, dos movimentos sociais, das “verdades” acerca da sexualidade, da maternidade, regionalidades, dentre outros. Referências BRASIL. Ministério da Saúde. Política nacional de Saúde integral da População negra: uma política para o SUS / Ministério da Saúde, Secretaria de Gestão Estratégica e Participativa, departamento de Apoio à Gestão Participativa. 2009. ______. Ministério da Saúde. Departamento de Ações Programáticas Estratégicas. Política Nacional de Atenção Integral à Saúde da Mulher: Princípios e Diretrizes/Ministério da Saúde. Brasília: Ministério da Saúde, 2011. CARNEIRO, Sueli. Enegrecer o feminismo: a situação da mulher negra na América Latina a partir de uma perspectiva de gênero. Rio de Janeiro: Takano Ed, 2003. CRENSHAW, Kimberlê. A intersecionalidade da discriminação de raça e gênero. Cruzamento: raça e gênero. UNIFEM, 2004. HASENBALG, C.A. Comentários “Raça, cultura e classe na integração das sociedades. Rio de Janeiro, Dados, revista de ciências sociais. vol. 27, n.3, p. 148-149,1984.
Título do Evento
10º CONINTER - CONGRESSO INTERNACIONAL INTERDISCIPLINAR EM SOCIAIS E HUMANIDADES
Título dos Anais do Evento
Anais do 10º CONINTER - CONGRESSO INTERNACIONAL INTERDISCIPLINAR EM SOCIAIS E HUMANIDADES
Nome da Editora
Even3
Meio de Divulgação
Meio Digital

Como citar

DELFINO, Cristiane Cordeiro da Silva. A SAÚDE DA MULHER NEGRA BRASILEIRA: DAS INTERSECCIONALIDADES DE GÊNERO E RAÇA.. In: Anais do 10º CONINTER - CONGRESSO INTERNACIONAL INTERDISCIPLINAR EM SOCIAIS E HUMANIDADES. Anais...Niterói(RJ) Programa de Pós-Graduação em, 2021. Disponível em: https//www.even3.com.br/anais/xc22021/412586-A-SAUDE-DA-MULHER-NEGRA-BRASILEIRA--DAS-INTERSECCIONALIDADES-DE-GENERO-E-RACA. Acesso em: 25/04/2025

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