O SEQUESTRO DO ÔNIBUS 174: A GENERALIZAÇÃO DO DIREITO PENAL DO INIMIGO ATRAVÉS DA TRAJETÓRIA DE SANDRO BARBOSA DO NASCIMENTO

Publicado em 23/12/2021

DOI
10.29327/154029.10-141  
Título do Trabalho
O SEQUESTRO DO ÔNIBUS 174: A GENERALIZAÇÃO DO DIREITO PENAL DO INIMIGO ATRAVÉS DA TRAJETÓRIA DE SANDRO BARBOSA DO NASCIMENTO
Autores
  • Bárbara Dos Santos Delatorre
  • Eduarda Castilho Rodrigues
  • Tatiana Mareto Silva
Modalidade
Resumo Expandido e Trabalho Completo
Área temática
GT 15 - Diversidade, desigualdades e opressões no tempo presente
Data de Publicação
23/12/2021
País da Publicação
Brasil
Idioma da Publicação
Português
Página do Trabalho
https://www.even3.com.br/anais/xc22021/431596-o-sequestro-do-onibus-174--a-generalizacao-do-direito-penal-do-inimigo-atraves-da-trajetoria-de-sandro-barbosa-do
ISSN
Palavras-Chave
Sandro; Estado; Inimigo; Jakobs; Negligência.
Resumo
Introdução O estudo teve como objetivo geral analisar como o Brasil desenvolve uma estratégia penal com fundamento na construção do inimigo, baseando-se nas definições de Günther Jakobs e seus estudos sobre a relação entre Estado e Sociedade, de modo a diferenciar os indivíduos entre sujeitos dotados de direitos que mantém vínculo com a definição de ser social que requer certas habilidades e o “inimigo” que, por preencher requisitos como frequente deturpação das normas e até mesmo seu contexto de vida, é distanciado da categoria “cidadã”. Teve como justificativa a crescente criminalidade urbana e a forma como o Direito Penal (e o Estado) atuam em políticas públicas de segurança pública, utilizando-se de um caso real como categoria de análise. O trabalho adotou a seguinte metodologia: pesquisa com abordagem qualitativa e quantitativa, com fontes bibliográficas e documentais e objetivos explicativos, discorrendo e explicando a história de Sandro Barbosa do Nascimento e a aparente falha por parte do Estado no que concerne ao auxílio à população carente e miserável. Teve como tópicos de abordagem o perfil de Sandro Barbosa do Nascimento e a teoria de Jakobs e a sociedade brasileira. 1. Fundamentação teórica Em 1985, Günther Jakobs, professor e filósofo alemão, aborda pela primeira vez a Teoria do Direito Penal do Inimigo, em uma palestra. Mais tarde, no ano de 2009, sua primeira obra sobre o tema foi lançada: “Direito Penal do Inimigo: Noções e Críticas”. Nesta, debate a respeito da divisão dos seres humanos entre ‘cidadãos’ e ‘inimigos’ a partir do referencial socioeconômico e/ou insistência na prática criminosa. Na última classificação, o indivíduo é isolado da sociedade de maneira a perder sua condição de sujeito de direito, podendo (e devendo), inclusive, ser eliminado pela força do Estado. Além disso, foi utilizado o documentário ÔNIBUS 174. Direção: José Padilha. 133 min. Rio de Janeiro: Riofilme, 2002. Outras obras de relevo sobre o direito penal do inimigo que foram utilizadas no trabalho são: GRECO, Luis. Sobre o chamado direito penal do inimigo. Revista da Faculdade de Direito de Campos, Ano VI, Nº 7 – 2005. Também foi utilizada a tese de doutorado de PERIAGO, Francisco R. A análise discursiva no documentário Ônibus 174. 2016. 232fl. Tese (Doutorado em Letras) – Universidade Presbiteriana Mackenzie – São Paulo, 2016, e as obras de PREUSSLER, Gustavo S.; CORDAZZO, Karine. A sociedade excludente: exclusão social, criminalidade e diferença na modernidade recente. Direito & Práxis. Rio de Janeiro: Revan, 2002, 314p e RODRIGUES, Robson. Os dilemas da pacificação: Notícias de Guerra e Paz em uma “Cidade Maravilhosa”. Instituto Igarapé. Rio de Janeiro. vol 7. pags 69/88. Agosto de 2014. Disponível em: https://igarape.org.br/wp-content/uploads/2014/07/artigo-8-p5.pdf. Acesso em: 30 de maio. 2021, além da obra de SANDEL, Michael J. Justiça: o que é fazer a coisa certa. 31ª ed. Rio de Janeiro: Civilização brasileira, 2020. 2. Resultados alcançados Aproximadamente às 14:30 do dia 12 de junho de 2000, iniciou o acontecimento que marcou a história do Rio de Janeiro e do Brasil. Um homem alto, negro e tatuado adentrou o ônibus da linha gávea, número 174, e, ao pular a catraca, deixou à mostra a arma calibre 38 que estava em sua cintura. Um dos passageiros, ao se conscientizar do iminente perigo, conseguiu escapar e informar a situação às autoridades de segurança. Logo após a abordagem policial, o motorista saiu do veículo pela janela. Ao constatar que o assalto havia se frustrado, o invasor passa a usar os passageiros como reféns. O sequestro foi amplamente coberto pela mídia e estima-se que 54 milhões de brasileiros assistiram aos eventos. Em paralelo, não havia somente o acompanhamento pelos veículos de notícia, muitas pessoas cercavam a cena do crime como uma espécie de público em um espetáculo. Ao final do “show”, a multidão avança sobre o agente criminoso com o intuito de promover seu linchamento. O sequestrador era Sandro Barbosa do Nascimento, nascido em 1978, filho de Clarice e de pai desconhecido. Junto com a família, viveu na comunidade do Rato Molhado, em São Gonçalo-RJ, até os 6 anos, onde sua mãe possuía um bar que era fonte da renda familiar e, posteriormente, tornou-se raiz dos seus traumas – foi no bar que Clarice foi esfaqueada e morreu na presença de seu filho. Depois da tragédia, Sandro acabou vivendo em situação de rua e foi na região da Candelária que encontrou uma “nova família”. Quando na maioridade, Sandro era dependente químico, sequenciando em habitualidade nas práticas de furto para manter os vícios, provocando dois indiciamentos: um por furto qualificado e outro por tentativa de assalto – crimes pelos quais cumpriu pena em sistema fechado. Sandro consegue fugir da instituição onde se encontrava preso e passa a morar no bairro Nova Holanda, onde conhece a Dona Elza, que havia tido um filho com o nome Alex, com quem perdeu contato ao completar 4 anos. A última informação que obteve era de que o menino estava em ‘‘situação de rua’’. Devido a semelhança entre a história de vida e os nomes fictícios Alex e Alessandro que Sandro utilizava, uma relação de mãe e filho é estabelecida entre ambos. Ela relata que Sandro tinha vontade de começar estudar e trabalhar, que queria encontrar a “Tia Yvonne” para que ela pudesse ajudá-lo. Em 1985, Gunther Jakobs, jurista alemão, traçou a teoria do Direito Penal do Inimigo que, embora ainda seja discutida por doutrinadores no que cerca sua abordagem, este afirmava tratar-se de “instrumento idôneo para descrever um determinado âmbito, de grande relevância, do atual desenvolvimento dos ordenamentos jurídico penais'' (JAKOBS, 2012, p. 52), definição a qual será utilizada para a discussão a seguir, ou seja, sua vertente descritiva. O doutrinador alemão pretendeu distinguir a figura do autor em dois polos, em que o primeiro representaria o direito penal do cidadão, punido somente quando exteriorizada a conduta criminosa e, no outro vértice, estaria o direito penal do inimigo, no qual o indivíduo seria criminalizado previamente, isto é, sem que, de fato, tenha ocorrido lesão ao bem jurídico (GRECO, 2005), posto que seria classificado como alguém de extrema periculosidade devido a sua habitualidade nas condutas criminosas e, dessa forma, estaria agindo conforme seu “Estado Natural”. Para Gunther Jakobs (1985 apud Mendes, 2011), o agente classificado como inimigo perderia o atributo de ‘pessoa’ por este ser um conceito social. Nesse sentido, o ser humano compreende um processo natural a qual todos são abarcados, ou seja, o cidadão, na condição de pessoa, carrega com si direitos e deveres e, assim, desempenha uma função social. O inimigo estaria deslocado do papel que deveria cumprir, juntamente com as expectativas normativas que os cercam, logo, representando um regresso ao Estado Natural, caracterizado pela ausência de normas. À vista disso, aquele que delinque deverá ser impedido por, além de colocar em risco um bem tutelado pelo direito penal, também ofender o ordenamento jurídico como um todo. Nessa perspectiva, é possível traçar um paralelo entre a trajetória de Sandro até o momento mencionado e uma adaptação da teoria abordada por Gunther Jakobs sobre o tratamento estatal em relação a esses indivíduos marginalizados: o chamado Direito Penal do Inimigo. Em harmonia com o filósofo e professor, tanto a sociedade quanto o próprio Estado tendem a enxergar tais pessoas como inimigas pela sua condição socioeconômica e influências, isto é, ao considerar o protagonista deste estudo, nota-se que, a partir do momento em que se insere na marginalidade e persiste na violação de tipos penais, deixa de ser cidadão e transforma-se em algo que deve ser eliminado, como exemplifica GRECO (2005) ao citar Jakobs, estabelecendo que o oponente do Estado não deve ser tratado como sujeito de direitos uma vez que não mais se encontra em situação de civilidade, devendo, assim, ser neutralizado (JAKOBS, 1985 apud GRECO, 2005. p. 218). Conclusões Diante dos fatos apresentados, conclui-se que Sandro Barbosa do Nascimento, após uma tragédia, sofreu diversas mazelas da falta de políticas públicas e foi invisibilizado pelo corpo social, de modo que a primeira intervenção estatal que o tocou foi a visão coletiva de que era fonte de problema para a segurança da comunidade, ou seja, sem antes enfrentar as causas que corroboraram para eventos como a candelária, a sociedade foi confrontada por indivíduos que foram transformados em inimigos por ela mesma. Dessa forma, se a violência desenfreada pelo Estado que, nas entrelinhas revoga o status de ‘‘pessoa’’ de uma parcela da população devido aos estigmas de cor ou condição socioeconômica, for a única forma de garantir uma pseudo defesa, então estaremos diante do chamado pelo popular de ‘‘remédio que mata o paciente”. Referências bibliográficas G1. Especial sobre ônibus 174 lembra erro de PM e narra a vida de Sandro. Disponível em: http://g1.globo.com/rio-de-janeiro/noticia/2015/06/especial-sobre-onibus-174-lembra-erro-de-pm-e-narra-vida-de-sandro.html. Acesso em: 27 mai. 2021 GRECO, Luis. Sobre o chamado direito penal do inimigo. Revista da Faculdade de Direito de Campos, Ano VI, Nº 7 - 2005. Disponível em: http://fdc.br/Arquivos/Mestrado/Revistas/Revista07/Docente/07.pdf. Acesso em: 30 mai. 2021. JAKOBS, Günther; MELIÁ, Manuel C. Direito Penal Do Inimigo: Noções e Críticas. 6ª Ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado Editora, 2012
Título do Evento
10º CONINTER - CONGRESSO INTERNACIONAL INTERDISCIPLINAR EM SOCIAIS E HUMANIDADES
Título dos Anais do Evento
Anais do 10º CONINTER - CONGRESSO INTERNACIONAL INTERDISCIPLINAR EM SOCIAIS E HUMANIDADES
Nome da Editora
Even3
Meio de Divulgação
Meio Digital
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Como citar

DELATORRE, Bárbara Dos Santos; RODRIGUES, Eduarda Castilho; SILVA, Tatiana Mareto. O SEQUESTRO DO ÔNIBUS 174: A GENERALIZAÇÃO DO DIREITO PENAL DO INIMIGO ATRAVÉS DA TRAJETÓRIA DE SANDRO BARBOSA DO NASCIMENTO.. In: Anais do 10º CONINTER - CONGRESSO INTERNACIONAL INTERDISCIPLINAR EM SOCIAIS E HUMANIDADES. Anais...Niterói(RJ) Programa de Pós-Graduação em, 2021. Disponível em: https//www.even3.com.br/anais/xc22021/431596-O-SEQUESTRO-DO-ONIBUS-174--A-GENERALIZACAO-DO-DIREITO-PENAL-DO-INIMIGO-ATRAVES-DA-TRAJETORIA-DE-SANDRO-BARBOSA-DO. Acesso em: 28/04/2025

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