AUTO DA COMPADECIDA NA TELEVISÃO: A DERROCADA DO MACHO NORDESTINO

Publicado em 23/12/2021

DOI
10.29327/154029.437835  
Título do Trabalho
AUTO DA COMPADECIDA NA TELEVISÃO: A DERROCADA DO MACHO NORDESTINO
Autores
  • Pablo de Oliveira Lopes
  • Lourdes Ana Pereira Silva
Modalidade
Resumo Expandido e Trabalho Completo
Área temática
GT 32 - Estudos interdisciplinares de televisão
Data de Publicação
23/12/2021
País da Publicação
Brasil
Idioma da Publicação
Português
Página do Trabalho
https://www.even3.com.br/anais/xc22021/437835-auto-da-compadecida-na-televisao--a-derrocada-do-macho-nordestino
ISSN
Palavras-Chave
Auto da Compadecida, televisão, gênero, interdisciplinaridade.
Resumo
Introdução Nas últimas décadas, a cultura das narrativas tem ganhado volume nas práticas sociais da vida cotidiana e, certamente, a televisão tem grande contribuição nesse fato . A partir de 1950, a linguagem televisiva foi um diferencial inovador para a difusão de variados discursos e diversas representações das sociedades. A televisão contemporânea tem passado por profundas alterações, ao se transformar, na convivência com outras plataformas; essas alterações não se restringem a aparatos tecnológicos, mas também no modo como as audiências se relacionam com seus produtos (SILVA, 2021). Exemplo da importância da televisão para a cultura das narrativas vem das várias adaptações da peça Auto da Compadecida, de Ariano Suassuna, que deu origem a diversas versões audiovisuais, a saber: A Compadecida, de George Jonas (1969), Os Trapalhões no Auto da Compadecida , de Roberto Farias (1987), a microssérie televisiva O Auto da Compadecida de Miguel Arraes (1999) e, o filme O Auto da Compadecida, também de Miguel Arraes (2000). Em Televisão: tecnologia e forma cultural (2016), Raymond Williams concebe a televisão como o lugar em que, simultaneamente, ocorrem três importantes processos: o tecnológico, o institucional e o cultural. Considerando o contexto socio-histórico, o autor problematiza a televisão enquanto tecnologia e forma cultural, e enfatiza que televisão e a esfera social são instâncias indissociáveis. Esse posicionamento conduz o autor a propor dois modos de estudar a televisão: a partir de seu desenvolvimento histórico, enquanto tecnologia, e como expressão de cultura. No delineamento deste estudo, assumimos o último modo, isto é, interessa-nos nesta investigação entender a televisão (no caso em questão, a obra audiovisual, o auto) como forma e expressão cultural. Assim, o objetivo desta pesquisa é entender como o duelo de corvardes, que envolve os personagens Chicó, Cabo Setenta e Vicentão, interpretados, respectivamente, pelos atores Selton Mello, Aramis Trindade e Bruno Garcia é capaz de nos ajudar a refletir de que modo uma obra audiovisual televisiva pode desconstruir a tradicional figura do denominado “macho nordestino”. 1. Fundamentação teórica O longa metragem O Auto da Compadecida derivou de minissérie homônima, exibida pela Rede Globo de Televisão em 1999. A televisão serviu, portanto, como plataforma para a releitura de uma obra cuja primeira encenação aconteceu, em 1956, no Recife. Na minissérie, aparecem personagens, como o Cabo Setenta, Rosinha e Vicentão, que não fazem parte da peça original, mas de Torturas de um Coração e de O Santo e a Porca, também escritas por Suassuna. A obra conta uma história que se passa na região Nordeste do Brasil, e que mescla elementos da tradição da Literatura de Cordel, do gênero comédia e do Barroco Católico brasileiro. Há uma mistura de cultura popular e tradição religiosa. No YouTube, Facebook, Instagram e Pinterest é possível encontrar diversas releituras de O Auto da Compadecida. Implica dizer que um segundo autor interpreta à sua maneira a obra original e a transforma, conforme seus critérios criativos, e segundo a linguagem da plataforma escolhida. No início do século XX, Walter Benjamin (1892-1940) considerou que a sociedade havia atingido um alto patamar de reprodutibilidade técnica; não sabia o autor o que o pensamento e as práticas acerca dos fenômenos comunicacionais da cibercultura nos reservava. Nesse sentido, destaca-se que audiência de O Auto da Compadecida se deu no âmbito da televisão, transbordou para o cinema e se alastrou pelas redes sociais. Conquistou adesão não somente no gosto popular, mas no gosto popular-massivo, no universo dos bens de consumo, e no mais tradicional modelo de cultura de massa capitalista. O gênero narrativo microssérie é compreendido como “[...] uma história fechada, com desenvolvimento e final decididos antes da produção e da exibição. Também é dividida em capítulos sequenciais [...]. (POMA, VIEGAS, 2009, p.3). No Brasil, surgiu na década de 1980, e praticamente duas décadas depois, quando ainda não tinha se consolidado como um fenômeno massivo no país, a microssérie O Auto da Compadecida, escrita por Adriana Falcão, Guel Arraes e João Falcão, foi exibida na televisão em quatro episódios em 1999 . No ano seguinte, foi transformada em filme e ganhou as telas do cinema, alcançando um público de mais de dois milhões de pessoas. Mesmo já tendo sido exibida como microssérie na televisão, foi sucesso de bilheteria. Obra de sucesso que nos permitiu abordar os conceitos de heteronormatividade, heterossexualidade e gênero, tendo como referência as discussões presentes em Nordestino: uma invenção do “falo”, uma história do gênero masculino (1920-1940), de Durval Muniz de Albuquerque Júnior (2013), e Manifesto Contrassexual: práticas subversivas de identidade sexual, escrito por Beatriz Preciado em 2014. O artigo analisa ainda quesitos da caracterização dos personagens e eventos da narrativa fílmica, considerando as definições de heteronormatividade, performatividade e subversão da performatividade, presentes no livro Bodies that matter, escrito por Judith Butler em 1993. 2. Resultados alcançados Depreendemos que as narrativas audiovisuais são importantes na construção de sentidos e que há padrões e estereótipos sobre o comportamento masculino em produções televisivas. Nas últimas duas décadas, os estudos sobre o audiovisual televisivo brasileiro têm colocado na centralidade do seu debate a ênfase na análise cultural, conforme sinalizamos a partir das contribuições de Williams (2016). O rompimento da figura do homem heterossexual torna-se ainda mais significativo por envolver personagens nordestinos, que, muitas vezes, carregam o estereótipo do “cabra-macho”, próprio de uma sociedade machista e heteronormativa. Refletimos sobre aspectos que dizem respeito às falas dos personagens e às suas atitudes, com base não só nos elementos lexicais utilizados nos textos, dentre eles as palavras empregadas, seus significados e sentidos proporcionados ao interlocutor, mas considerando também a forma como as estruturas sociais se fazem presentes no discurso, encarando que a sociedade e a linguagem estabelecem entre si uma relação simbiótica. A discussão envolve, assim, questões que dizem respeito a gênero, sexualidade, comportamento e identidade, o que exige a participação interdisciplinar de diferentes campos do saber, tais quais as ciências humanas, as ciências sociais aplicadas, a história, a comunicação audiovisual, e a análise crítica do discurso. Dessa maneira, propusemos uma ampla problematização da masculinidade, encarando-a como uma construção social. Conclusões A televisão, por meio das obras audiovisuais, acaba, muitas vezes, por reproduzir a visão que a sociedade tem sobre os homens. O duelo envolvendo Chicó, Cabo 70 e Vicentão redefine os papeis masculinos e redefine a figura do homem nordestino: entra o homem frouxo e covarde e sai o “macho”, destemido e valente. Atitudes que demonstram fragilidade e falta de coragem povoam a cena analisada neste artigo. Cai por terra o mito da identidade e do comportamento masculinos que se estabelecem natural e biologicamente. A contestação e o questionamento aos padrões sociais impostos por uma sociedade surgem em meio à mudança de valores, à luta pela afirmação da identidade e alcança posição de destaque na subversão de papéis pré-estabelecidos. Referências bibliográficas ALBUQUERQUE JÚNIOR, Durval Muniz de. Nordestino: invenção do “falo”. Uma história do gênero masculino (1920-1940). São Paulo: Intermeios, 2013. LOPES, Pablo de Oliveira. Heteronormatividade em cena: a masculinidade nordestina posta em xeque no duelo de covardes de “O Auto da Compadecida”. In: Lourdes Ana Pereira Silva. (Org.). Auto da Compadecida: interfaces interdisciplinares. 1ed. Andradina: Meraki, 2021, v. 1, p. 72-89. O AUTO da Compadecida. Direção de GUEL ARRAES. Brasil: Globo Minissérie televisivas, 2000. 1 DVD (104 min.). SILVA, Lourdes Ana Pereira. Paisagens de uma pesquisa: a cartografia como perspectiva teórico-metodológica. In: Lourdes Ana Pereira Silva. (Org.). Auto da Compadecida: interfaces interdisciplinares. 1ed. Andradina: Meraki, 2021, v. 1, p. 15-44. WILLIAMS, Raymond. Televisão: tecnologia e forma cultural. São Paulo: Boitempo, 2016.
Título do Evento
10º CONINTER - CONGRESSO INTERNACIONAL INTERDISCIPLINAR EM SOCIAIS E HUMANIDADES
Título dos Anais do Evento
Anais do 10º CONINTER - CONGRESSO INTERNACIONAL INTERDISCIPLINAR EM SOCIAIS E HUMANIDADES
Nome da Editora
Even3
Meio de Divulgação
Meio Digital
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Como citar

LOPES, Pablo de Oliveira; SILVA, Lourdes Ana Pereira. AUTO DA COMPADECIDA NA TELEVISÃO: A DERROCADA DO MACHO NORDESTINO.. In: Anais do 10º CONINTER - CONGRESSO INTERNACIONAL INTERDISCIPLINAR EM SOCIAIS E HUMANIDADES. Anais...Niterói(RJ) Programa de Pós-Graduação em, 2021. Disponível em: https//www.even3.com.br/anais/xc22021/437835-AUTO-DA-COMPADECIDA-NA-TELEVISAO--A-DERROCADA-DO-MACHO-NORDESTINO. Acesso em: 26/04/2025

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