PRODUÇÃO DA BARBÁRIE: REMOÇÕES FORÇADAS NAS COMUNIDADES DO BAIRROS DA PAZ, KM 17, JARDIM ABAETÉ E VILA ROMANA EM SALVADOR/BA

Publicado em 27/07/2022 - ISBN: 978-65-5941-759-9

Título do Trabalho
PRODUÇÃO DA BARBÁRIE: REMOÇÕES FORÇADAS NAS COMUNIDADES DO BAIRROS DA PAZ, KM 17, JARDIM ABAETÉ E VILA ROMANA EM SALVADOR/BA
Autores
  • Laila Nazem Mourad
  • Aparecida Netto Teixeira
  • Francine Damasceno Pinheiro
Modalidade
Resumo expandido
Área temática
GT 04 – Despejos, remoções e conflitos fundiários
Data de Publicação
27/07/2022
País da Publicação
Brasil
Idioma da Publicação
Português
Página do Trabalho
https://www.even3.com.br/anais/xicbdu2022/480566-producao-da-barbarie--remocoes-forcadas-nas-comunidades-do-bairros-da-paz-km-17-jardim-abaete-e-vila-romana-em-
ISBN
978-65-5941-759-9
Palavras-Chave
Remoção Forçada; Violação de Direitos; Danos materiais e imateriais; Direito a moradia e a cidade
Resumo
PRODUÇÃO DA BARBÁRIE: REMOÇÕES FORÇADAS NAS COMUNIDADES DOS BAIRROS DA PAZ, KM 17, JARDIM ABAETÉ E VILA ROMANA EM SALVADOR/BA Laila Nazem Mourad Aparecida Netto Teixeira Francine Damasceno Pinheiro 1 INTRODUÇÃO A remoção forçada de comunidades deve ser compreendida como uma violação de direitos humanos, e se contrapõe ao direito fundamental à moradia. Este processo evidencia as desigualdades de gênero, raça e classe e demonstra como o racismo estrutural define o território da cidade, excluindo majoritariamente negros e mulheres do acesso a direitos e políticas públicas. Proteger o direito fundamental à moradia é se comprometer com formas de restituição, indenização ou substituição que garantam a plenitude da vida. Desse modo, a reparação integral é obrigação do Estado, ou empresas, em assumir a responsabilidade pelos danos materiais ou imateriais de forma a restituir e indenizar pessoas ou coletivos por suas perdas. Nesse contexto, o presente artigo visa analisar as violações de direitos humanos decorrentes do processo de remoção forçada pelo governo do estado da Bahia, das comunidades do Bairro da Paz, Km 17 de Itapuã, Jardim Abaeté e Vila Romana (Salvador/BA) na implantação das obras de macrodrenagem dos rios Jaguaribe e Mangabeira, projeto polêmico sob o ponto de vista ambiental e social. Estas comunidades estão localizadas entre uma das principais avenidas de Salvador, Av. Paralela (Avenida Luís Viana Filho) e a Orla Atlântica (Avenida Otávio Mangabeira), e nos últimos anos vem passando por um acelerado processo de urbanização e crescente valorização imobiliária, com consequente transformação do capital fundiário em imobiliário. 2 APRESENTAÇÃO DE RESULTADOS O estudo identifica como o Estado da Bahia, através da Companhia de Desenvolvimento Urbano do Estado da Bahia (CONDER), vem descumprindo as regras internacionais e nacionais, violando o direito à moradia, retirando famílias de suas casas e localidades, sem a justa compensação, inviabilizando o pleno exercício do direito social, com prejuízos materiais e imateriais (MOURAD; TEIXEIRA). Para a identificação das violações dos direitos humanos face a este processo de remoção forçada utilizou-se como procedimento metodológico a pesquisa-ação, com centralidade na participação direta das comunidades atingidas que se reconhecem como sujeitos históricos, em contínuo processo de ação-reflexão-ação, a partir da própria realidade na qual se inserem e interagem . A pesquisa-ação abrangeu a realização de oficinas e rodas de conversa, durante o período de janeiro a dezembro de 2021, com a participação da comunidade. As rodas de conversa consistiram em atividades específicas de escuta; identificação de problemáticas; elaboração e consolidação das estratégias e alternativas contra a violação dos direitos humanos. Para definir quem deve ser reconhecido como atingido por um grande empreendimento deve-se considerar os grupos ou indivíduos que vivenciam o deslocamento físico, mas também aqueles que podem ser tão ou mais prejudicados que os deslocados fisicamente, sempre que seus meios e modos de vida sejam comprometidos. Assim, o termo atingido, refere-se às populações que enfrentam um ou outro tipo de deslocamento (CDDPH ), que provocam os danos materiais e imateriais, considerando-se os impactos e as perdas vivenciadas por indivíduos, famílias, comunidades, grupos sociais específicos, que interfiram nos meios e modos de vida material. Também podem ser comprometidas tradições culturais, laços e redes sociais, lugares de valor simbólico e/ou religioso, conformando um conjunto de perdas que se podem designar como perdas imateriais ou intangíveis. São muitos os direitos violados no processo de remoção forçada. Inicialmente, destaca-se a falta de devido processo legal que está garantido na Constituição Federal de 1988, no Art. 5º, inciso LIV ao afirmar que “ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal”. Trata-se de um direito fundamental indisponível que subsidia a proteção aos demais direitos. Nas comunidades analisadas não houve a garantia do devido processo legal, sendo desse modo, negado o direito ao contraditório e à ampla defesa, decorrente do pleno exercício da participação e do acesso às informações que permitiriam construir uma contraposição ao processo de remoção. Para fugir à legalidade, o Estado da Bahia, através de sua empresa pública (Companhia de Desenvolvimento Urbano - CONDER), criou uma série de procedimentos visando promover “acordos individuais com os moradores” de forma a “esvaziar” o território de forma rápida. O acordo nefasto imposto aos moradores transfere a posse de seus imóveis ao Estado, sem justa indenização e com valores indenizatórios ínfimos, sendo os mesmos privados do direito à moradia adequada e de suas condições de vida. Desse modo, embora a doutrina venha considerando a posse como um direito real (MELO ; TARTUCE ), quando se trata de população de baixa renda, persevera o descompromisso com a posse. A falta de direito dos removidos, assim como a atuação intencional de violação dos mesmos por parte do Estado da Bahia é uma estratégia para remoção dos “inconvenientes” (PINHEIRO ), liberando territórios para a ação do capital. A política da administração das urgências é uma política sem lei, sem processos, sem defesa, sem documentos. Um cenário em que cabe ao cidadão beneficiário, confiar nos saberes peritos e obedecer às ordens ditadas; colocar-se no papel de sacrifício para o desenvolvimento econômico e social. Gourlard ao estudar a teoria sociológica da posse no direito brasileiro, afirma que é dever interpretar o Código Civil à luz dos princípios constitucionais da garantia da moradia digna e do cumprimento da função social da posse, a fim de que a Constituição seja efetivada. Não há contradição entre os instrumentos jurídicos, e sim complementariedade, na medida em que a posse é um instituto importantíssimo para a efetivação da justiça social. Nesse sentido, deve-se garantir não só o direito ao usucapião, mas também o justo pagamento pela posse em casos de desapropriação, não diferenciando, a título indenizatório, a posse da propriedade. Nas comunidades analisadas os moradores são legítimos possuidores há mais de 30 anos; têm direito à posse e a propriedade daqueles imóveis e não podem transmitir seu patrimônio sem uma justa indenização. Por isso, é inconcebível a postura do Estado da Bahia, que deve reparar o direito de posse dos moradores, indenizando integralmente, como se proprietários fossem, nos termos da legislação nacional e internacional e dos documentos oficiais a respeito de remoção forçada. Neste contexto a matriz é um instrumento de identificação e organização dos danos sofridos pelas pessoas, famílias e comunidades que vivenciaram o processo de remoção, visando a compensação financeira e a proposição de políticas públicas, garantindo o direito à cidade e a moradia digna. A compensação financeira é a principal forma de reparação adotada pela Corte Interamericana de Direitos Humanos. Ela pressupõe o ressarcimento de todos os prejuízos causados em decorrência da violação de direitos humanos, considerando também os danos imateriais decorrentes do sofrimento da vítima. Nos territórios atingidos foram apontados os seguintes danos materiais pelas comunidades: o desconhecimento da posse e do valor da terra para as indenizações; a desvalorização do preço da posse em relação ao da propriedade; valor dado à edificação abaixo do mercado, danos comunitários decorrentes da obra; desvalorização das benfeitorias; danos às propriedades de quem não estava sendo atingido diretamente pelo empreendimento; perda de renda decorrente da impossibilidade de realizar o trabalho em sua própria moradia, ou em ponto comercial, na comunidade; despesas decorrentes da ausência de plano de reassentamento ou remoção, aumento dos preços de aluguéis, com o aumento da procura por imóveis; perda da infraestrutura: escola/creche, equipamentos sociais, ponto de ônibus, água, luz, esgoto/igreja, metrô, lazer, mercado/feira, etc; aumento do custo de vida por valorização imobiliária dos imóveis; desconsideração da valorização imobiliária no preço da indenização, inviabilizando a compra de outro imóvel. Os principais danos imateriais identificados estão relacionados ao sofrimento psíquico pela expulsão de seu território, de sua história, interrompendo projetos de vida, retirando chances ou oportunidades, desfazendo relações comunitárias, parentais e entre amigos e vizinhos. Os danos materiais, segundo critérios estabelecidos pela Corte devem ser reparados considerando os preços de mercado e as decisões do próprio Tribunal que estabelecem o que deve ser reparado. 3. CONCLUSÃO OU CONSIDERAÇÕES FINAIS A partir da pesquisa realizada foi possível fomentar um amplo debate com as comunidades a respeito do direito à cidade e a moradia, do acesso à terra urbanizada, e a sociabilidade identificando quais os direitos materiais e imateriais foram violados e quais as formas de repará-los. Em consequência, foi possível identificar os elementos que deverão compor a matriz de danos materiais e imateriais a serem reparados no processo de remoção forçada, buscando a compensação financeira das perdas econômicas das famílias e o acesso a políticas públicas de moradia digna. Trata-se da primeira experiência no Estado da Bahia de processo de construção de uma matriz de danos em decorrência de remoções forçadas. Este instrumento é fundamental para reforçar a ideia que toda violação de direito humano deve ser reparada integralmente, a partir da centralidade das vítimas, promovendo a educação em direitos humanos, o fortalecimento da organização popular e a identificação dos valores a serem reparados, dando materialidade às lutas sociais. REFERÊNCIAS CDDPH. Conselho de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana. Comissão Especial “Atingidos por Barragens”. Resoluções n.ºs 26/06, 31/06, 01/07, 02/07, 05/07. Brasília, DF: CDDPH, 2010. Disponível em: http://www.mpf.mp.br/atuacao-tematica/ccr6/dados-da-atuacao/encontros-nacionais-e-regionais/xi-encontro-nacional/xi-encontro/legislacao/relatorio-sintese-cddph. Acesso em: 07 de fev. 2021. GOULARD, Roberta Torres Aldigueri. A Teoria Sociológica da posse no Código Civil Brasileiro. Artigo para conclusão de pós-graduação na EMERJ. 2015. Disponível em: RobertaTorresAldigueriGoulart.pdf (tjrj.jus.br). Acesso em: 07 de fev. 2021. MELO, Marco Aurélio Bezerra de. Direito das Coisas, 5. ed., Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2011. MOURAD, Laila Nazem; TEIXEIRA, Aparecida Netto. et al. Nota Técnica n° 01/2020. Análise da metodologia adotada pelo Estado da Bahia (CONDER/CTB) para avaliação dos imóveis atingidos pelos projetos de macrodrenagem dos rios Jaguaribe e Mangabeira e do Monotrilho/VLT, em Salvador, BA. 2020. PINHEIRO, Francine Damasceno. Quando a casa sai? A política de reconstrução de moradias para os afetados em desastres no Vale do Cuiabá, Petrópolis, RJ. 2014. Tese (Doutorado). - Programa de Pós-Graduação de Ciências Sociais em Desenvolvimento Agricultura e Sociedade, Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro, Instituto de Ciências Humanas e Sociais, 2014. TARTUCE, Flávio. Manual de Direito Civil. 4 ed. rev., atual. e ampl. Rio de Janeiro: Método, 2014.
Título do Evento
XI Congresso Brasileiro de Direito Urbanístico
Cidade do Evento
Salvador
Título dos Anais do Evento
Anais do XI Congresso Brasileiro de Direito Urbanístico
Nome da Editora
Even3
Meio de Divulgação
Meio Digital

Como citar

MOURAD, Laila Nazem; TEIXEIRA, Aparecida Netto; PINHEIRO, Francine Damasceno. PRODUÇÃO DA BARBÁRIE: REMOÇÕES FORÇADAS NAS COMUNIDADES DO BAIRROS DA PAZ, KM 17, JARDIM ABAETÉ E VILA ROMANA EM SALVADOR/BA.. In: Anais do XI Congresso Brasileiro de Direito Urbanístico. Anais...Salvador(BA) UCSal, 2021. Disponível em: https//www.even3.com.br/anais/xicbdu2022/480566-PRODUCAO-DA-BARBARIE--REMOCOES-FORCADAS-NAS-COMUNIDADES-DO-BAIRROS-DA-PAZ-KM-17-JARDIM-ABAETE-E-VILA-ROMANA-EM-. Acesso em: 28/04/2025

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