APROXIMANDO O DIREITO URBANÍSTICO DO DIREITO ECONÔMICO: A CONSTRUÇÃO DE UMA AGENDA DE PESQUISAS A PARTIR DO MÉTODO ANALÍTICO-SUBSTANCIAL

Publicado em 27/07/2022 - ISBN: 978-65-5941-759-9

DOI
10.29327/166881.11-22  
Título do Trabalho
APROXIMANDO O DIREITO URBANÍSTICO DO DIREITO ECONÔMICO: A CONSTRUÇÃO DE UMA AGENDA DE PESQUISAS A PARTIR DO MÉTODO ANALÍTICO-SUBSTANCIAL
Autores
  • ANA MARIA ISAR DOS SANTOS GOMES
Modalidade
Resumo expandido
Área temática
GT 01 – Experiências de ensino, pesquisa e extensão em Direito Urbanístico; teoria do Direito Urbanístico seus objetivos e princípios; intersecções e articulações com os demais ramos e teorias do Direito
Data de Publicação
27/07/2022
País da Publicação
Brasil
Idioma da Publicação
Português
Página do Trabalho
https://www.even3.com.br/anais/xicbdu2022/482681-aproximando-o-direito-urbanistico-do-direito-economico--a-construcao-de-uma-agenda-de-pesquisas-a-partir-do-metod
ISBN
978-65-5941-759-9
Palavras-Chave
Direito Urbanístico, Direito Econômico, Planejamento Urbano, método analítico-substancial, fato urbano.
Resumo
XI CONGRESSO DE DIREITO URBANÍSTICO GT 01 APROXIMANDO O DIREITO URBANÍSTICO DO DIREITO ECONÔMICO: A CONSTRUÇÃO DE UMA AGENDA DE PESQUISAS A PARTIR DO MÉTODO ANALÍTICO-SUBSTANCIAL Ana Maria Isar dos Santos Gomes1 RESUMO: O estudo procura articular o Direito Urbanístico com o Direito Econômico por meio da utilização do método analítico-substancial, desenvolvido no âmbito do Direito Econômico por Washington Peluso Albino de Souza. A pesquisa é bibliográfica, documental e jurisprudencial, de caráter interdisciplinar. A metodologia consiste na adaptação do método analítico-substancial para a interpretação das normas de Direito Urbanístico, por meio de duas etapas. Na primeira, o método é adaptado ao novo paradigma hermenêutico representado pela virada linguística. Na segunda etapa, trabalha-se o conteúdo da norma jurídica de Direito Urbanístico, isto é, o fato urbano juridicizado. A pesquisa demonstra que a utilização do método analítico-substancial no âmbito do Direito Urbanístico permite compreender o papel do Estado no planejamento urbano para além de sua atuação como Estado-fiscalizador e Estado-arrecadador, ou seja, como agente econômico que, ao lado dos demais agentes e dos atores políticos que influenciam a política urbana, produz o espaço urbano. Conclui-se que o método proposto pode se mostrar bastante útil para a construção de um quadro principiológico e conceitual que permita ao intérprete da norma de Direito Urbanístico partir da realidade material (fato urbano) para a Constituição normativa (planejamento justo) e de volta à realidade material, dando, assim, maior efetividade aos preceitos constitucionais que garantem o direito à cidade. Palavras-chave: Direito Urbanístico. Direito Econômico. Método Analítico-Substancial. Fato Urbano. Planejamento Urbano. INTRODUÇÃO: Existe um distanciamento entre a realidade material das cidades brasileiras e os preceitos constitucionais garantidores do direito à cidade. Esse distanciamento pode ser atribuído, em parte, à influência que a doutrina administrativista exerce sobre os operadores do Direito. Por doutrina administrativista denomino uma corrente do Direito Urbanístico que opera os conceitos e princípios desse ramo do Direito ainda sob a perspectiva de um Estado fiscalizador-arrecadador neutro, dotado do “jus imperium” e preocupado prioritariamente com os aspectos operacionais dos instrumentos jurídico-urbanísticos. Por outro lado, uma dogmática capaz de articular a Constituição normativa com a realidade material das cidades brasileiras precisa compreender a atuação dos agentes sociais e econômicos e dos atores políticos que disputam o uso do território a partir do conflito de interesses que orienta a produção do espaço urbano. Para contribuir com essa tarefa, a pesquisa procura construir uma metodologia de estudo que articule o Direito Urbanístico e o Direito Econômico. Uma investigação acerca do estado da arte deste tema mostra que Pinto (2010)2 , Gaio (2015)3 e Apparecido Júnior (2017)4 buscam aproximar o estudo do Direito Urbanístico da Ciência Econômica. Contudo, esses autores analisam o planejamento urbano sob o critério da eficiência técnica, assumindo que o Estado tem uma posição neutra no planejamento urbano, como sugere a Análise Econômica do Direito. Sob um viés crítico, Scarpi (2010)5 trabalha o princípio da gestão democrática das cidades, apontando a contradição entre a norma jurídico-constitucional que institui esse princípio e a lógica mercantil que preside as relações humanas travadas nas cidades brasileiras. Franzoni (2014)6 , por sua vez, enfrenta o problema das desigualdades socioespaciais nas cidades a partir de uma interpretação do princípio da função social da propriedade que valoriza seus aspectos redistributivos. Esta pesquisa procura articular o Direito Urbanístico não propriamente com a Economia, mas com o Direito Econômico - por meio do método analítico-substancial, proposto pelo jurista Washington Peluso Albino de Souza. A escolha desse método deve-se ao fato de que ele permite partir da realidade social, política e econômica, ou seja, do fato (ser) para construir a interpretação da norma jurídica (dever-ser) que condiciona o planejamento urbano estatal. OBJETIVOS E HIPÓTESE O objetivo geral da pesquisa é propor a utilização, no Direito Urbanístico, de um método hermenêutico que permita compreender a atuação do Estado como agente econômico produtor do espaço urbano. Como objetivo secundário, o trabalho investiga se a utilização do método analítico-substancial no Direito Urbanístico contribui para: a) uma interpretação das normas de Direito Urbanístico de forma a dar cumprimento à “cláusula de transformação” (BERCOVICI, 2003 7 ) da Constituição Federal - interpretada especialmente a partir do seu artigo 3º, que estabelece os objetivos da sociedade brasileira, entre os quais a erradicação da pobreza e a redução das desigualdades socioespaciais; b) a construção de uma dogmática mais útil à concretização da “ideologia constitucionalmente adotada” pela Constituição brasileira. Por “ideologia constitucionalmente adotada” compreende-se o conjunto de princípios extraídos de diferentes ideologias políticas e econômicas e absorvidos pelo conjunto principiológico estabelecido em uma determinada Constituição normativa (ALBINO DE SOUZA, 2002 8 ). A pesquisa propõe a seguinte hipótese: A aplicação do método analítico-substancial permite: a) articular o fato urbano (realidade material) e o planejamento urbano (regramento normativo); b) alcançar as ações e estratégias dos agentes sociais e econômicos e dos atores políticos produtores do espaço urbano; c) compreender o papel do Estado como agente econômico produtor do espaço (direta ou indiretamente); d) propor uma interpretação do planejamento urbano consentânea com a “ideologia constitucionalmente adotada”. MÉTODO: A pesquisa bibliográfica, documental e jurisprudencial, de caráter interdisciplinar, alcançou as áreas da Filosofia, Sociologia Urbana, Planejamento Urbano e Geografia - com destaque à obra completa de Milton Santos e a grande parte dos escritos de David Harvey. A adaptação do método analítico-substancial para o Direito Urbanístico se fez em duas etapas. Na primeira etapa, o método foi adaptado para o novo paradigma hermenêutico, segundo o qual o intérprete não extrai o sentido da norma jurídica do texto constitucional, mas constrói seu sentido a partir da realidade na qual está inserido. Essa etapa se fez necessária porque o método foi proposto por Albino de Souza ainda no paradigma hermenêutico anterior à virada linguística promovida em meados do século passado a partir dos estudos de Ludwig Wittgenstein. Nessa primeira etapa, a adaptação do método utilizou a teoria realista-dialética, trabalhada por Caffé Alves 9 . Assim, ao invés de considerar, como proposto originalmente, que o intérprete extrai a “ideologia constitucionalmente adotada” diretamente do texto constitucional, assumiu-se que a “ideologia constitucionalmente adotada” é construída por meio da práxis jurídica. Essa práxis, por sua vez, é influenciada pelas possibilidades materiais que se apresentam ao intérprete da norma no momento de sua aplicação. Isso não significa que a Constituição possa ser interpretada com base no subjetivismo do intérprete. Ao contrário, a “ideologia constitucionalmente adotada” é construída de forma objetiva, a partir do confronto entre a norma – dotada de força impositiva e transformadora – e as relações sociais, econômicas e políticas que constituem a realidade material. No método analítico-substancial o intérprete constrói o sentido da norma a partir do confronto entre a realidade material (compreendida com o auxílio do conhecimento científico – geográfico, econômico, político, sociológico etc.) e a realidade pretendida (os objetivos previstos na Constituição). A segunda etapa consistiu em adaptar o conteúdo da norma, que é um fato juridicizado. Como o método foi elaborado no âmbito do Direito Econômico, ele trabalha o fato econômico. Para adaptá-lo ao Direito Urbanístico, foi realizado um estudo do fato urbano a partir do referencial teórico produzido pela Geografia Crítica. Por meio desse estudo, foi possível: a) alcançar os interesses e ações dos diferentes agentes sociais e econômicos e dos atores políticos que produzem o espaço urbano nacional; b) compreender o papel do Estado como agente econômico promotor do desenvolvimento urbano, não só sob a lógica de um sistema redistributivo de renda, mas também sob a lógica da alteridade, reconhecida pelo conjunto principiológico colocado na Constituição da de 1988. RESULTADOS E DISCUSSÃO A análise do fato urbano – especialmente das contradições na produção capitalista do espaço relacionadas à provisão dos recursos urbanos e à forma como operam os agentes sociais e econômicos na produção do espaço urbano - revelou que a desigualdade socioespacial decorre não somente do desequilíbrio na distribuição de recursos urbanos, mas da apropriação desigual da renda fundiária urbana. Essa última causa está diretamente associada ao movimento contínuo e acelerado de renovação urbana – impulsionado pela associação do capital produtivo com o capital financeiro. Uma das razões para isso é o fato de que alterações na forma espacial das cidades são extremamente desvantajosas para as classes sociais com menor poder aquisitivo porque: a) promovem gentrificação, diminuindo as chances de acesso dessas classes aos recursos urbanos; b) têm efeitos negativos decorrentes da relação entre localização de empregos e localização de residências; c) resultam em aumento de gastos públicos para instalação de equipamentos públicos e rede de prestação de serviços em áreas distantes da malha urbana consolidada ou, no modelo do neoliberalismo de austeridade, em desassistência à população removida das áreas visadas pelo mercado; d) criam escassez artificial, o que aumenta o preço dos imóveis de forma desproporcional. Essa escassez é definida hoje em função de vantagens locacionais criadas pelo próprio mercado. Portanto, a diminuição das desigualdades socioespaciais depende não só de uma justa distribuição de recursos urbanos, mas principalmente do controle da produção do espaço urbano. Como o planejamento estatal não é neutro e imparcial, mas influenciado pela atuação dos agentes e atores que produzem o espaço, o Estado precisa controlar e limitar a atuação dos grupos sociais ligados ao capital produtivo e financeiro, reorientando a produção do espaço urbano, estimulando as áreas menos valorizadas pelo mercado e controlando os processos de especulação imobiliária. Uma das descobertas que resultaram da aplicação do método analítico-substancial na área do Direito Urbanístico diz respeito ao tratamento dado aos instrumentos de recuperação da valorização do solo urbano. A utilização de forma indiscriminada do conceito de “mais valias” para identificar tanto a valorização decorrente da “mais valia” obtida na atividade produtiva quanto as externalidades produzidas pela ação de outros agentes econômicos confunde o papel do Estado como mero arrecadador financeiro com o seu papel de agente econômico responsável pela produção do espaço (de forma direta, quando atua como Estado-empresário, ou indireta, quando regulamenta a atuação dos demais agentes). Dessa forma, ao invés de priorizar os instrumentos criados para controlar a produção do espaço urbano, como o IPTU Progressivo no Tempo, os estudos de Direito Urbanístico costumam se concentrar nos instrumentos jurídico-urbanísticos destinados à arrecadação financeira, tais como ONALT, ODIR, PPP etc. Tais instrumentos interessam ao capital, porque são utilizados nos processos de renovação urbana acelerada necessária à sua reprodução. Outro ganho da pesquisa é a constatação de que a utilização do método analítico-substancial abre novas possibilidades para a construção de um quadro conceitual e principiológico do Direito Urbanístico sob uma perspectiva funcional. Buscando dar aplicabilidade ao método, a pesquisa formulou um conceito de desenvolvimento urbano com base no pluralismo cultural e produtivo, princípio que orienta a “ideologia constitucionalmente adotada” em 1988. A absorção desse princípio na interpretação das normas que garantem o direito à cidade passa pela compreensão de que a Constituição não só reconhece diversos modos de produção econômica e de vida – o que impõe ao Estado o dever de estimular diferentes formas de produção do espaço urbano consentâneas com tais modos de produção e de vida - como afirma a democracia participativa como critério de aferição da legitimidade das decisões em política urbana. Além disso, o método permitiu construir um conceito de território mais útil ao Direito Urbanístico do que o conceito utilizado na Teoria Geral do Estado. CONCLUSÕES: A aplicação do método analítico-substancial nos estudos de Direito Urbanístico permite passar de uma visão meramente instrumental do planejamento urbano, preocupada com a eficiência dos instrumentos jurídico-urbanísticos sob o aspecto formal, para uma visão político-econômica, na qual se compreende e, assim, se pode melhor regular, a conduta dos agentes sociais e econômicos e atores políticos do ponto de vista da justiça urbana. Sob essa visão, o critério para valorar a ordem urbana como justa/injusta é um critério político-econômico extraído da “ideologia constitucionalmente adotada”. O papel do Direito Urbanístico, sob tal perspectiva, é identificar, a partir da interpretação da “ideologia constitucionalmente adotada”, os critérios de justiça escolhidos pelo Poder Constituinte, ou seja, os princípios que devem nortear o planejamento urbano de forma a garantir o direito à cidade. A articulação entre o fato urbano e a norma jurídica, propiciada pelo método analítico-substancial, permite utilizar o conhecimento interdisciplinar para dar a alguns conceitos essenciais do Direito Urbanístico significados mais precisos, o que abre uma agenda de pesquisa com o fim de construir um quadro teórico-conceitual a partir da articulação entre o Direito Econômico e o Direito Urbanístico. ________________ 1 Doutora em Direito pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais – PUC Minas, mestre em Geografia pela Universidade de Brasília – UnB, bacharel em Direito pela Universidade de Brasília – UnB e Procuradora do Distrito Federal, e-mail: anaisar@uol.com.br. 2 PINTO, Victor Carvalho. Direito Urbanístico: plano diretor e direito de propriedade. 2ª ed. rev. e atual. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2010. 3 GAIO, Daniel. A interpretação do Direito de Propriedade em face da Proteção Constitucional do Meio Ambiente Urbano. Rio de Janeiro: Renovar, 2015. 4 APPARECIDO JUNIOR, José Antonio. Direito Urbanístico Aplicado: os caminhos da eficiência jurídica nos projetos urbanísticos. Curitiba: Editora Juruá, 2017. 5 SCARPI, Vinicius. Alienação e Transcendência: da insuficiência do Estatuto da Cidade para a constituição de um direito da cidade com viés crítico. 2010. Tese (Doutorado em Direito da Cidade). Faculdade de Direito, Universidade do Estado do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2010. 6 FRANZONI, Julia Ávila. Política Urbana na Ordem Econômica. Belo Horizonte: Arraes Editores, 2014. 7 BERCOVICI, Gilberto. Desigualdades Regionais, Estado e Constituição. São Paulo: Max Limonad, 2003. 8 ALBINO DE SOUZA, Washington Peluso. Teoria da Constituição Econômica. Belo Horizonte: Del Rey, 2002. 9 CAFFÉ ALVES, Alaôr. Dialética e Direito: linguagem, sentido e realidade – fundamentos a uma teoria crítica da interpretação do Direito. Barueri: Manole, 2010. E-book.
Título do Evento
XI Congresso Brasileiro de Direito Urbanístico
Cidade do Evento
Salvador
Título dos Anais do Evento
Anais do XI Congresso Brasileiro de Direito Urbanístico
Nome da Editora
Even3
Meio de Divulgação
Meio Digital
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Como citar

GOMES, ANA MARIA ISAR DOS SANTOS. APROXIMANDO O DIREITO URBANÍSTICO DO DIREITO ECONÔMICO: A CONSTRUÇÃO DE UMA AGENDA DE PESQUISAS A PARTIR DO MÉTODO ANALÍTICO-SUBSTANCIAL.. In: Anais do XI Congresso Brasileiro de Direito Urbanístico. Anais...Salvador(BA) UCSal, 2021. Disponível em: https//www.even3.com.br/anais/xicbdu2022/482681-APROXIMANDO-O-DIREITO-URBANISTICO-DO-DIREITO-ECONOMICO--A-CONSTRUCAO-DE-UMA-AGENDA-DE-PESQUISAS-A-PARTIR-DO-METOD. Acesso em: 27/12/2024

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