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Educação: Um Campo de Batalha Decisivo
“QUANDO A EDUCAÇÃO NÃO É LIBERTADORA, O SONHO DO OPRIMIDO É SER O OPRESSOR."
Paulo Freire.
Na abertura do Agrishow, em Ribeirão Preto, em 29 de Abril de 2019, o Presidente Capitão Jair Bolsonaro anunciou que pretende mudar o Patrono da Educação Brasileira, título outorgado a Paulo Freire pelo Congresso brasileiro em 2012. Não surpreende que, em sua cruzada contra as artes e os artistas, contra a cultura e os agentes culturais, contra as universidades e a ciência, na obstinada ofensiva lançada contra a educação pública, humanista e laica, o presidente brasileiro, assim como Trump e outras lideranças e grupos de extrema direita, veja na cultura um inimigo a ser abatido e na educação reflexiva e crítica uma ameaça aos projetos autoritários e obscurantistas que representa.
A educação e a cultura, na verdade, vêm se transformando em um dos campos de batalha decisivos da guerra sem quartel declarada à democracia, à liberdade de expressão e ao próprio conceito de cidadão nascido do iluminismo: ser humano livre … e não indivíduo servil e domesticado. E isto não acontece apenas no Brasil, mas em toda a América Latina, na África e na Ásia, e também na América do Norte e Europa, onde movimentos xenófobos, homófobos, supremacistas e racistas pretendem negar e destruir as possibilidades de sobrevivência e renovação dos saberes e culturas dos subalternizados. O que está em jogo é: quais os valores, visões de mundo, conceitos e práticas serão hegemônicas no tecido social e sobre quais bases se poderá construir uma sociedade livre, democrática e justa, com confiança no potencial emancipatório da diversidade e da educação crítica?
Daí a enorme atualidade de Paulo Freire e seu chamado a uma pedagogia emancipatória, popular, a uma educação concebida como reconhecimento e troca de saberes, como construção simultânea e relacional de educadores e educandos, partes de um processo que ao transformar ambos os torna aptos a transformarem o mundo em que vivem.
Atualidade da Educação Popular e Cidadã que se revela em cada universidade indígena que se constroi e afirma na Bolívia ou Equador, em cada escola da Selva Lacandona, em experiências de escolas comunitárias na África, em cada movimento social que, no Brasil ou na Índia, busca formar seus próprios educadores e militantes. Mas também em cada universitário que abandona o conforto do gabinete para arriscar-se num encontro, que muitas vezes é também desencontro e confronto, com dinâmicas coletivas que constroem sujeitos políticos e, necessária e simultaneamente, sujeitos de conhecimento.
Afirmar a atualidade da Educação Popular impõe reconhecer, porém, os muitos e novos desafios com que se defronta. Como se relacionar com a Escola Pública que, ao longo desses últimos 50 anos, caminhou nos países periféricos em direção à universalização, mas também em direção a uma educação pobre, castradora, voltada simplesmente para adestrar e domesticar os filhos da classe trabalhadora? Como poderia e deveria a Educação Popular absorver, elaborar e projetar-se como caminho de luta pela justiça ambiental e por um tratamento integrado e integrador, holístico, da crise ambiental e das mudanças climáticas? Como fazer com que a Educação Popular fortaleça e se enriqueça a partir das experiências de agroecologia e contribua para o avanço das lutas pela reforma agrária? De que modo aprender com novas modalidades de associativismo, cooperativismo e economia popular e solidária? Como lidar com as novas tecnologias de informação e comunicação, com o acesso crescente a meios de difusão de ideias que, contraditoriamente, convivem com a oligopolização dos meios de comunicação de massa? Seremos capazes de incorporar às práticas e metodologias tradicionais o uso e difusão das mídias digitais? Como articular a formação de subjetividades aptas a lidar com identidades de classe, de gênero, étnicas e outras? Como articular conhecimentos de âmbito local, regional, nacional e internacional e como assegurar processos de luta que reconheçam as singularidades locais e a necessária convergência internacional das lutas que atendem a interesses comuns de todos os povos?
A razão de ser e o sentido mesmo da Educação Popular permanecem, como em suas origens, o reconhecimento de que a prática social constitui a base sobre a qual se produzem conhecimentos e emergem consciências críticas capazes de impulsionar processos de transformação social. Mas estes princípios hoje devem ser discutidos e concretizados em um mundo que redefine e reconfigura as relações identitárias e as escalas de reflexão e ação. Estamos desafiados pela dimensão sistêmica de processos que são simultaneamente políticos, econômicos, culturais, ambientais/climáticos e dizem respeito às múltiplas identidades dos que lutam pelo reconhecimento e por seus direitos.
A Educação Popular está, pois, como nunca, colocada diante de uma crise sistêmica e desafiada a contribuir para a invenção de caminhos e modos de vida emancipatórios.
Popular Education: A Decisive Battle Field
“When education is not liberating, the dream of the oppressed is to become the oppressor"
Paulo Freire.
At the opening of the “Agrishow” in Ribeirão Preto on 2019, April 29, President Capt. Jair Bolsonaro announced that he intends to change the Patron of Brazilian Education, a title given to Paulo Freire by the Brazilian Congress in 2012. Not surprisingly, in his crusade against the arts and artists, against culture and cultural agents, against universities and science, in the stubborn offensive against public, humanist and secular education, the Brazilian president, as well as Trump and other extreme Right-wing leaders and groups see in the culture an enemy to be shot down and in reflexive and critical education a threat to the authoritarian and obscurantist projects he represents.
Education and culture, in fact, have become one of the decisive battlegrounds of the declared war on democracy, freedom of expression and the concept of a citizen born of the Enlightenment: a free human being and not a servile individual and domesticated. Not only in Brazil, but throughout Latin America, Africa and Asia, as well as in North America and Europe, xenophobic, homophobic, supremacist and racist movements seek to deny and destroy the possibilities of survival and knowledge and cultures of the subaltern. This is the main question: what values, world views, concepts, and practices will be hegemonic in the social life and on what basis can a free, democratic and just society be built, with a belief in the emancipatory potential of diversity and critical education?
Hence the enormous relevance of Paulo Freire and his call for collective action, to an emancipatory, popular education, an education conceived as recognition and exchange of knowledge, as a simultaneous and relational construction of educators and learners, parts of a process that, while transforming both, makes them capable of transforming the world in which they live.
The contemporaineity of Paulo Freire and of the Popular and Citizen Education is revealed in each indigenous university that is built and affirmed in Bolivia or Ecuador, in each school in the Lacandona Jungle in Mexico, in community school experiences in Africa, in every social movement that, in Brazil or in India, seek to form its own educators and militants. But also in each scholar that leaves the comfort of the office to risk a meeting, which is often also disagreement and confrontation, with collective dynamics that build political subjects and, at the same time, necessarily subjects of knowledge.
To affirm the relevance of Popular Education, however, means to recognize that many new challenges face it. How to relate to the Public School that, over the past 50 years, has been moving towards universalization in many peripheral countries, but also towards a poor, castrating education, simply turned to training and taming the children of the working class? How could and should Popular Education absorb, elaborate and project itself as a path of struggle for environmental justice and an integrated and holistic treatment of the environmental crisis and climate change? How to make Popular Education strengthen and enrich from the experiences of Agroecology and contribute to the advancement of struggles for Agrarian reform? How to learn with new modalities of associationism and cooperativism and popular and solidarity economy? How to deal with the new information and communication technologies, with the increasing access to means of diffusion of ideas that, contradictorily coexist with processes that promote the oligopolization of the mass media? Will we be able to incorporate into traditional practices and methodologies the use and diffusion of digital media? How to articulate the formation of subjectivities capable of dealing with class, gender, ethnic, and other identities? How to articulate local, regional, national and international knowledge and how to ensure processes of struggle that recognize the local singularities and the necessary international convergence of struggles that serve the common interests of all peoples?
The rationale and the very meaning of Popular Education remain, as in its origins, the recognition that social practice is the basis on which knowledge is produced and critical consciences emerge capable of promoting processes of social transformation. But these principles today must be discussed and concretized in a world that redefines and reconfigures identity relationships and scales of reflection and action. We are challenged by the systemic dimension of processes that are simultaneously political, economic, cultural, environmental/climatic and relate to the multiple identities of those struggling for recognition and for their rights.
The Popular Education is, as never before, faced with a systemic crisis and challenged to contribute to the invention of emancipatory ways and ways of life.
Educación Popular: Un Campo de Batalla Decisivo
“Cuando la educación no es libertadora, el sueño del oprimido es ser opressor”
Paulo Freire
En la Apertura de la feria de exposiciones Agrishow, en la localidad de Ribeirão Preto (Provincia de São Paulo) en 29 de abril de 2019, el Presidente Capitán el Presidente Capitán Jair Bolsonaro anunció que pretende cambiar el Patrono de la Educación Brasileña, título otorgado a Paulo Freire por el Congreso brasileño en 2012. No sorprende que, en su cruzada contra las artes y los artistas, contra la cultura y los agentes culturales, contra las universidades y la ciencia, en la obstinada ofensiva lanzada contra la educación pública, humanista y laica, el presidente brasileño, así como Trump y otros líderes y grupos de extrema derecha, vea a la cultura como un enemigo a ser derribado y en la educación reflexiva y crítica una amenaza a los proyectos autoritarios y oscurantistas que representa.
La educación y la cultura, en verdad, vienen transformándose en uno de los campos de batalla decisivos de la guerra sin cuartel declarada a la democracia, a la libertad de expresión y al propio concepto de ciudadano que naciera en el iluminismo: ser humano libre…y no un individuo servil y domesticado. Esto no sucede solamente en el Brasil, sino en toda América Latina, en el África y en el Asia, y también en América del Norte y Europa, donde movimientos xenófobos, homofóbicos, supremacistas y racistas pretenden negar y destruir las posibilidades de supervivencia y renovación de los saberes y las culturas de los dominados. Lo que está en juego es: ¿Qué valores, visiones de mundo, conceptos y prácticas serán hegemónicas en el tejido social y sobre cuáles bases se podrá construir una sociedad libre, democrática y justa, con confianza en el potencial emancipador de la diversidad y la educación crítica?
Así se destaca la enorme actualidad de Paulo Freire y su llamada a la acción colectiva, una educación emancipadora, popular, concebida como reconocimiento al intercambio de saberes, como construcción simultánea y relacional de educadores y educandos, parte de un proceso que al transformar ambos los vuelve aptos a transformar el mundo en que viven.
La actualidad de la Educación Popular y ciudadana se revela en cada universidad indígena que se construye y afirma en Bolivia o Ecuador, en cada escuela de la Selva Lacandona, en experiencias comunitarias en el África, en cada movimiento social que, en el Brasil o en la India, busca formar sus propios educadores y militantes. Pero también en cada universitario que abandona la comodidad del gabinete para arriesgarse en el encuentro, que muchas veces es también desencuentro y enfrentamiento, con dinámicas colectivas que construyen sujetos políticos y, necesaria y simultáneamente, sujetos de conocimiento.
Afirmar la actualidad de la Educación Popular impone reconocer, sin embargo, los muchos y nuevos desafíos con los que se enfrenta. ¿Cómo relacionarse con la Escuela Pública que, a lo largo de los últimos 50 años, caminó en muchos países periféricos en dirección a la universalización, pero también en dirección a una pobre educación para los más pobres, castradora, orientada simplemente para adiestrar y domesticar a los hijos de la clase trabajadora? ¿Cómo podría y debería la Educación Popular absorber, elaborar y proyectarse como camino de lucha por la justicia ambiental y por un tratamiento integrado e integrador, holístico, de la crisis ambiental y de los cambios climáticos? ¿Cómo hacer para que la Educación Popular fortalezca y se enriquezca a partir de las experiencias de la agroecología y contribuya para el avance de las luchas por la reforma agraria? ¿De qué modo aprender con las nuevas modalidades de asociacionismo, cooperativismo y economía popular y solidaria? ¿Cómo lidiar con las nuevas tecnologías de información y comunicación, con el acceso creciente a los medios de difusión de ideas que, contradictoriamente, conviven con procesos que promueven la oligopolización de los medios de comunicación masivos?¿Seremos capaces de incorporar a las prácticas y metodologías tradicionales el uso y la difusión de los medios digitales? ¿Cómo articular la formación de subjetividades aptas a lidiar con identidades de clase, de género, étnicas y otras? ¿Cómo articular conocimientos de ámbito local, regional, nacional e internacional y cómo asegurar procesos de lucha que reconozcan las singularidades locales y la necesaria convergencia internacional de las luchas que atienden a intereses comunes de los pueblos?
La razón de ser y el propio sentido de la Educación Popular permanecen, como en sus orígenes, en el reconocimiento de que las prácticas y las luchas sociales constituyen la base sobre la cual se producen conocimientos y surgen consciencias críticas capaces de impulsar procesos de transformación social. Pero estos principios hoy deben ser discutidos y concretizados en un mundo que redefine y reconfigura las relaciones identitarias y las escalas de reflexión y acción. Somos desafiados por la dimensión sistémica de procesos que son simultáneamente políticos, económicos, culturales, ambientales/climáticos y se refieren a múltiples identidades de los que luchan por el reconocimiento y por sus derechos. La crisis sistémica convoca a la Educación Popular a contribuir con la invención de caminos y modos de vida emancipadores.