O IV Seminário Nacional Pensando o Projeto Pensando a Cidade, cuja última edição foi em 2022, é um evento organizado pelo Programa de Pós-Graduação Projeto e Cidade (PROCIDADE) que visa debater a produção científica e acadêmica relacionada ao contexto da arquitetura do urbanismo e das práticas de intervenção social na cidade.
O PROCIDADE procura refletir sobre o campo disciplinar da arquitetura e urbanismo, visando compreender suas questões, aberturas e diálogos, possíveis respostas e os obstáculos inerentes às pesquisas em Arquitetura e Urbanismo da atualidade. Nesse sentido, este evento tem um caráter inter e transdisciplinar por dialogar com as áreas das ciências políticas, sociologia, antropologia, artes e design, comunicação, história, geografia, entre outras, no que concerne à produção da cidade e do habitat.
Nesta edição, o evento tem como proposta temática Territórios Insurgentes. Num mundo em múltiplas crises: econômica-social, política-institucional e ambiental vê-se novos atores sociais atuando na vida cotidiana buscando alternativas para situações de exclusão, segregação e sobrevivência em cenários de guerras e emergências climáticas. Muitos desses atores se organizam em grupos, movimentos, coletivos, ou por interesses estratégicos pontuais. Abordar a questão dos Territórios Insurgentes significa dar visibilidade às práticas desses coletivos que estão na margem da sociedade, nas periferias ou em áreas urbanas não valorizadas destacando suas ações e estratégias. De forma complementar, busca-se refletir sobre as propostas institucionalizadas para as cidades, com seus planos diretores e a tentativa de homogeneização, controle e mercantilização dos espaços. Essa contradição alimenta outras formas de participação e intervenção na cidade, cujo período pandêmico e pós-pandêmico tem contribuído para destacar.
O objetivo deste evento é criar um espaço de reflexão, trocas e interação sobre a produção do conhecimento sobre a cidade e a arquitetura a partir do diálogo entre pesquisadores(as) acadêmicos ou não, coletivos sociais e atores institucionalizados.
Territórios Insurgentes dialoga com a ideia do “urbanismo insurgente” ou “cidadanias insurgentes”. Pensando um século XXI amalgamado em múltiplas crises e, dentre elas, a crise de representação institucional, a contemporaneidade marcada por guerras, exclusão social e desigualdade extrema, tem visto emergir diferentes coletivos sociais que atuam de forma contestatória e paralela aos mecanismos institucionais de participação. A cultura maker ou do “faça você mesmo” e as lutas de caráter autonomista, como o “Occupy Wall Street” nos EUA, as manifestações de 2013 no Brasil, ou a Primavera Árabe mostraram um século XXI com novas formas de mobilização dos sujeitos sociais. Paralelamente, a crise ambiental com os eventos extremos cada vez mais evidentes no globo e o contexto pós-pandêmico onde muitas das vítimas do vírus foram pessoas pobres, negras e sem acesso a recursos, colocaram diferentes desafios para o planejamento das cidades e as práticas de projeto.
Em urbanismo insurgente, práticas de design, artes e ocupação visual e estética da cidade têm sido estratégias de denúncia e (re)ocupação dos espaços públicos. No campo da arquitetura, as práticas do processo de projeto têm desenvolvido metodologias de caráter não coloniais dialogando com comunidades periféricas, quilombolas, indígenas, coletivos culturais e outros, procurando evidenciar falas e ideias não hegemônicas e populares. A memória, a cultura, o patrimônio é resgatado sob uma visão não colonial, destacando a população negra e combatendo aspectos do racismo ambiental, estrutural e institucional.
As cidades transformaram-se em laboratórios de intervenções urbanas que expõem pressões políticas e sociais dos quais emergem territórios insurgentes, arenas de lutas por reconhecimento e reivindicação de direitos, como à moradia, à natureza, ao espaço público, que convergem para o direito fundamental de existir. Cidades são, a um só tempo, territórios do cuidado, onde se estabelecem políticas públicas sociais, como territórios da exclusão, onde vigora a produção de dinâmicas sociais excludentes. O modo de vida urbano contemporâneo, entre a urbanização extensiva e a consolidação das metrópoles como espaços centrais da disputa de poder, tem contribuído para a transformação dos espaços urbanos periféricos por meio de práticas espaciais insurgentes.
Reconhecendo essas transformações em curso na sociedade, pensar Territórios Insurgentes nos leva a entender a necessidade de explorar questões identitárias, paisagens culturais e processos políticos que têm sido objeto dos estudos urbanos brasileiros. É fundamental identificar os apagamentos socioespaciais e compreender em que medida as assimetrias de poder ainda constituem as abordagens epistemológicas críticas. Ou, ainda, entender como as práticas que se propuseram a superá-las enfrentaram o desafio imposto pelos processos recentes de desterritorialização. A proposta é debater e questionar os processos que constituíram e constituem os territórios insurgentes e que, diante de um novo horizonte para a ordem mundial, têm a oportunidade de repensar suas histórias e seus papéis no futuro do planeta, no sentido de imaginar e construir um mundo menos hierárquico e mais igualitário.