12º Simpósio do Patrimônio Material e Imaterial
“Patrimônio Cultural: diversidade, mobilização social e o direito à cidade”
Apresentação e Proposta
O
Simpósio do Patrimônio Material e Imaterial é uma realização do Departamento de
Patrimônio Histórico (DPH) da Unidade de Gestão de Cultura de Jundiaí (UGC) em
parceria com as Faculdades de Tecnologia (Fatecs) Jundiaí,
Itu e São Paulo, em 2018, passou a integrar a
programação do Mês do Patrimônio Histórico e Cultural de Jundiaí.
O
Mês do Patrimônio faz parte do calendário municipal
oficial de Jundiaí, desde 2019, e é reconhecido como um
programa municipal de educação patrimonial realizado durante o mês de agosto,
que tem o objetivo de inserir na pauta de discussões da gestão patrimonial os
resultados das pesquisas, reflexões e intervenções no âmbito da preservação do
patrimônio cultural.
Este
ano, em sua décima segunda edição, a
ser realizada em 29, 30 e 31 de
agosto, o Simpósio tem como tema central a interface entre patrimônio, diversidade
e mobilização social.
O
geógrafo David Harvey (2012), inspirando-se em Lefebvre (2001) defende o
direito à cidade como um dos direitos humanos fundamentais. Esse direito não se
refere à apropriação individual do espaço urbano, mas
só ocorre na dimensão do coletivo em contraponto à mercantilização da cultura e
aos resultados imediatos da financeirização do capital:
O direito à cidade se manifesta como forma superior dos direitos: direito à liberdade, à individualização na socialização, ao habitat e ao habitar. O direito à obra (à atividade participante) e o direito à apropriação (bem distinto do direito à propriedade) estão implicados no direito à cidade (Lefebvre, 2001, p. 125).
As
cidades são espaços de vida, de cultura e de educação. Apresentam-se com
múltiplas dimensões, seja como construção histórica (logo em permanente
movimento), espaço das representações e de disputas (econômicas, políticas e de
valores). As várias dimensões interagem numa relação espaço e tempo tematizada
por Milton Santos.
O sentido e entendimento da cidade se produz na
articulação destas dimensões e não são expressões abstratas apenas presentes no
pensamento e expectativas dos cidadãos. São expressões de fato –
materializações de um agir e viver sociais que possuem uma expressão
espacial – em permanente
processo de (re)construção.
A cidade contempla estas materialidades
expressas espacialmente – definidoras de uma paisagem como resultado e condição
das relações entre as diversas identidades culturais nela presentes
em cada momento histórico. A cidade é portadora de diferentes territorialidades
que nos mostram diferentes temporalidades.
De
acordo com Albagali (2004), a territorialidade é construída a partir dos
processos de interação que ocorrem no território ao longo do tempo e é possível
fortalecê-las “[...] estimulando laços de identidade e cooperação baseados no
interesse comum de proteger, valorizar e capitalizar aquilo que um dado
território tem de ‘seu’ [...]” (Albagali, 2004, p.63).
Assegurar
o direito ao patrimônio requer uma atuação conjunta das instituições
governamentais e das comunidades locais para a adoção de políticas de proteção
e gestão sustentável do patrimônio que fomente à participação da sociedade
civil nas discussões e tomada de decisões, bem como a sensibilização da
comunidade sobre a importância de um patrimônio cultural que evidencie as
contribuições de todos os grupos étnicos, sociais e culturais.
Eixo 1 –
Patrimônio Cultural e Natural, gestão
participativa e ativismo social
O
patrimônio desempenha um papel crucial na preservação da memória
coletiva e na representação da dimensão intercultural da sociedade,
fortalecendo o seu senso de pertencimento. Porém, o direito ao patrimônio,
muitas vezes, enfrenta ameaças, devido à urbanização acelerada e desordenada, à
falta de planejamento urbano e de políticas adequadas de preservação
patrimonial e ambiental, à especulação imobiliária entre outros fatores que
levam à perda e reconhecimento dos vestígios materiais do passado. A emergência
climática e a busca da qualidade de vida nos levam a repensar as relações
entre cultura e natureza, cultura e civilização, entre o tempo do trabalho e o
tempo livre.
A participação ativa da
sociedade civil na seleção, valorização e proteção do patrimônio cultural e
natural permite que representantes da comunidade se envolvam no processo de
atribuição de significados aos bens culturais que representam a identidade, a
memória e a tradição de grupos culturalmente distintos, tornando o processo de
patrimonialização e de preservação patrimonial e ambiental mais representativo,
inclusivo e democrático.
Essa perspectiva vem ampliando a oportunidade de
diferentes grupos formadores da sociedade brasileira se verem representados por
um patrimônio que exprima a sua pluralidade cultural, contemplando não só as
raízes luso-brasileiras, mas também as origens indígenas, a presença africana e
as inúmeras contribuições de outras etnias e culturas, presentes desde o início
da história do país (IPHAN, 2006, p. 55).
A participação social no processo de seleção, valorização e preservação do
patrimônio é uma forma de ativismo que pode resultar em políticas de reparação
histórica, ao explicitarem as narrativas ocultadas, as memórias silenciadas e
as múltiplas identidades culturais dos povos colonizados que durante décadas
não se viram representados nas políticas de preservação patrimonial.
Prioriza-se, portanto, a diversidade cultural e a pluralidade de saberes na
perspectiva dos povos marginalizados pelo processo de colonização visando
combater a discriminação e a marginalização dos povos indígenas e
afrodescendentes (Santos, 2013).
O reconhecimento e valorização do patrimônio
imaterial, ocorrido nos anos 2000, com a publicação do Decreto 3551/2000, que
instituiu o registro de bens imateriais contribuiu com a acentuação desse
processo ao promover tanto uma ampliação tipológica dos bens patrimonializados
com a possibilidade de reconhecimento dos saberes, formas de expressão,
celebrações e lugares. Também promoveu a participação mais ativa da comunidade
produtora desses bens no processo de inscrição e salvaguarda do patrimônio
imaterial (Marins, 2016, p.16-17).
As diversas políticas e instrumentos de gestão do
patrimônio, como os conselhos municipais de cultura e de patrimônio e a
possibilidade de elaboração participativa dos Planos Diretores e dos Planos
Municipais de Cultura, envolvendo diferentes setores da sociedade, como
artistas, gestores culturais, acadêmicos e representantes da comunidade, tornam
o processo de identificação, seleção, valorização, proteção e gestão do
patrimônio cultural mais colaborativo e participativo.
Eixo
2 - Educação Patrimonial, representatividade social e pluralidade
cultural
A
educação patrimonial consiste em
processos educativos formais e não formais
que têm como foco o Patrimônio Cultural, apropriado socialmente como recurso
para a compreensão sócio-histórica das referências culturais em todas as suas
manifestações, a fim de colaborar para seu reconhecimento, sua valorização e
preservação (IPHAN, 2014, p. 19).
A
Educação Patrimonial desempenha um papel fundamental no reconhecimento e na
evidenciação das múltiplas expressões culturais presentes em nossa sociedade,
bem como na compreensão da participação dos diversos grupos étnicos e sociais
na produção do patrimônio cultural brasileiro. As ações educativas
destinadas à seleção, valorização e proteção patrimonial contribuem para a
promoção da inclusão social e para o fortalecimento da identidade cultural das
comunidades nos espaços reconhecidos ou não como patrimônios.
Os
projetos, ações, metodologias e ferramentas de educação patrimonial devem
primar pela construção do conhecimento de maneira crítica e participativa,
envolvendo a atuação efetiva da comunidade. Realizados
em espaços formais e não formais da educação, tais ações e
projetos devem
basear suas ações em um processo dialógico, que se faz no
respeito aos múltiplos olhares, saberes e narrativas possíveis dos diferentes
sujeitos sociais. Devem ser entendidas como processo de construção de
conhecimentos e não atividades meramente informativas de reprodução de
conteúdos prontos e acabados, demandando, portanto, um fazer-se constante (Scifoni, 2020, p. 322).
A
educação patrimonial reforça o papel dos órgãos de preservação, das
instituições de ensino, dos museus, dos centros culturais, dos coletivos e de
outros agrupamentos sociais na construção coletiva do conhecimento relacionado
ao patrimônio cultural que leve em consideração a multiplicidade de saberes,
experiências e vivências da sociedade com as suas referências culturais. Esse
tipo de estratégia leva à ampliação dos debates, reflexões e ações sobre o
processo de identificação, valoração e salvaguarda do patrimônio, bem como
viabilizam uma revisão de premissas sobre as políticas de preservação
patrimonial para que sejam mais participativas e
democráticas.
Eixo
3 – Turismo, lazer e políticas
de cidadania participativa
O
processo de mercantilização da cultura e de fomento ao turismo e ao lazer
suscita uma série de transformações nas formas de uso cultural e exploração
econômica do patrimônio cultural e dos territórios patrimonializados,
pautando-se na apreciação e valorização das suas referências históricas e
culturais.
O
turismo e o lazer são atividades culturais
e socio-econômicas que podem promover
inúmeras experiências culturais, além de possibilitar o
maior contato e conhecimentos dos turistas e cidadãos
em geral sobre as referências históricas, artísticas e
identitárias de comunidades diversas e dos territórios onde habitam. O patrimônio
cultural de natureza material e imaterial figura como importante atrativo na
configuração dos espaços públicos e privados.
Dotados
de materialidade e representação, as edificações isoladas e conjuntos
arquitetônicos exprimem as marcas do tempo no território, ativam lembranças, reavivam
ou reinventam tradições e são marcos simbólicos representativos de inúmeras
cidades. Muitas dessas edificações destacam-se como
importantes lócus de atração turística, sendo locais de visitação relevantes
contemplados nos roteiros turísticos desenvolvidos e ofertados por guias de
turismo, agências, operadoras de viagens e organizadores
de eventos.
A destinação dos espaços públicos dos centros
históricos, como praças, ruas e becos para a exibição de eventos e
manifestações culturais diversas, realçam o seu dinamismo artístico e cultural,
tornando-os estratégias de animação cultural que transformam
os espaços públicos em áreas de lazer, cultura, recreação e entretenimento
(Beni, 2006). Isso eleva ainda mais
a atratividade turística desses territórios e reforçando o papel de
centralidade cultural dos centros urbanos como espaços de cultura e lazer.
Atualmente,
observa-se a participação mais ativa e até mesmo um protagonismo das
comunidades locais no planejamento, organização e desenvolvimento do turismo,
principalmente, no Turismo de Base Comunitária, no Turismo Étnico e no
Afroturismo, consideradas modalidades que se destinam à apresentação de outras
narrativas sobre o patrimônio visando ressemantizar, expor e evidenciar as
múltiplas identidades culturais, o passado histórico, as memórias e os saberes
comunitários. Por meio dos conhecimentos populares, das
experiências e vivências culturais apresentados pelos próprios membros das
comunidades locais enfatiza-se o seu protagonismo em
diferentes maneiras de interpretação e difusão do seu rico
acervo patrimonial, reforçando-se assim a
necessidade da sustentabilidade socioambiental das estratégias de turismo e de
lazer.
A
participação ativa das comunidades em fóruns de discussão, consultas públicas,
comitês gestores e conselhos de turismo e cultura fortalece os mecanismos de
gestão participativa dos destinos turísticos e a criação de incentivos que
beneficiem verdadeiramente as comunidades locais, os visitantes e contribuem com a
preservação e valorização de um patrimônio cultural múltiplo e diverso.
As
diferentes cidades estão, na perspectiva de territórios inteligentes, obtendo
de maneira integrada o status de municípios de interesse turístico para todos,
visitantes e moradores. Um dos desafios, nesse sentido, é a capacitação técnica
e tecnológica dos profissionais da área de turismo
e de eventos para contribuírem na elaboração dos planos
de desenvolvimento turístico e cultural das cidades.