"Não tenho certeza de nada, mas a visão das estrelas me faz sonhar.”
(Van
Gogh, Cartas a Théo)
Sonhos: tema caro aos
psicanalistas, mesmo porque protótipo das formações do inconsciente.
A
escuta dos sonhos na clínica ainda faz parte de nosso instrumental? Ou guarda
algo de nostálgico? Até que ponto podemos ser fiéis ao Freud da Interpretação dos Sonhos? Ou ir
além da Deutung (Interpretação) e
tomar em conta a ideia de trabalho do sonho, trabalho da análise, trabalho da
escuta, que potencializa a pluralidade de espaços psíquicos, que permite estar
no “entre”, na fronteira, entre o sono e a vigília, entre as certezas e as
oscilações, entre o terror diante da angústia e certa possibilidade de
elaboração?
Tempos
sombrios: temos dito invariavelmente essa expressão, para caracterizar o mundo atual, que propõe
desafios, angústia, hiperconectividade, esvaziamento dos afetos, falta de um
outro próximo com quem possamos dialogar, escutar e sermos escutados.
Retomar
a potência do sonho, do espaço onírico, da “outra cena", que coloca em
pauta que somos seres de fronteira, do “entre”, da diversidade de espaços
psíquicos, parte deles colonizados por
imperativos categóricos que dificultam o sonhar e o deslocamento da dura
realidade que nos circunda, em busca da forma própria e singular disponível
para todos nós, mas cujo acesso conta
muito com o trabalho psíquico, forjado no eu, no outro, no mundo, na cultura.
Acompanhados
de Freud, de nossa clinica, de nossos sonhos, dos sonhos dos Yanomami, que os
escutam em outra chave, e nos mostram o risco da alienação da vida psíquica
e coletiva: o sonho como remédio para
acordar para um mundo mais justo.
Dora
Tognolli
Abril/
2023