Webinário Internacional Amazônia Negra

O grupo de estudo e pesquisa NÓSMULHERES (Pela Equidade de Gênero Étnico-racial), em face dos enfrentamentos políticos, ambientais, econômicos e sociais da atual conjuntura, convida todas, todos e todes ao Webinário Internacional “Amazônia Negra: imagens, narrativas e saberes em diálogo” que ocorrerá integralmente por modalidade virtual, nos dias 8, 9 e 10 de dezembro.

O propósito do evento é reafirmar as conexões necessárias da academia com as perspectivas e saberes militantes produzidos dentro e fora da universidade. O eixo são os movimentos negros em sua intelectualidade e contribuição crítica no reconhecimento da heterogeneidade amazônica, enraizada em trânsitos ancestrais de mulheres e homens negros, cis, trans e pessoas não binárias, que fazem da memória um contínuo exercício de construção do presente. Considerando seus deslocamentos, migrações, mobilidades e fronteiras, fomentamos olhares que incorporem categorias sociais de diferenciação como gênero, raça, nacional/regional em trânsito na Améfrica Ladina (como nos ensina Lélia González) e nas Guianas para outras cartografias, do Brasil e do mundo.

Assim o evento acompanha o debate crítico de uma Amazônia reduzida à imagem idílica de exuberância, hibridez e exotismo produzida pelo colonialismo, como estratégia de homogeneização das identidades que, desterritorializadas, passam por uma tentativa constante de apagamento histórico, político e cultural. O Webinário incita, desse modo, a interlocução de vozes de diferentes espaços da negritude amazônida, dialogando também com distintas frentes de pesquisa, estudo e militância nos processos de resistência e afirmação das identidades e ancestralidades negras em diáspora. Falando, portanto, de outras experiências e de experiências outras que subvertem tudo que se diz por aí, tão longe e tão perto de uma Amazônia negra e, proporcionando novos olhares e reflexões na construção de afetividades, práticas narrativas e políticas emancipatórias.

Thiane Neves Barros escreve sobre a primeira obra literária de Mônica Conrado, carioca radicada em Belém, professora na Universidade Federal do Pará e coordenadora do Grupo de Estudos e Pesquisa Nós Mulheres. 

Quando comecei a ler Meu Mundo! Eu, rio e Mar meu ímpeto foi de cheirar o papel, como faço com todos os livros pelos quais tenho apreço. A sensação que eu tive foi de que se fosse física aquela versão da minha leitura, ele – o livro - teria cheiro de rio e mar. Não qualquer rio, mas do rio Emojá, nem de qualquer mar, mas o da travessia diaspórica, que por vezes tem lembrança de saudade. A estrela da nossa aventura é a Marina, a Mar, e começamos a jornada em uma quinta-feira de 37º às 13h15, na Cidade de Esperança, em meio ao Mercado São Jorge, cuja descrição é tão viva e saborosa que quase nos remete ao Mercado do Ver o Peso ou à Feira de São Joaquim. Ali nas primeiras páginas, a autora nos coloca em contato com a beleza da juventude de Marina, seus olhos, seus cabelos e sua poesia declamada para o amor que se foi como uma sombra. Rio e Mar são águas que nos levam a inúmeras poesias. A narrativa de Meu Mundo! Eu, rio e Mar nos conduz ao “Vir ao mundo” de Marina, filha de Fernanda e Gilmar, afilhada do sábio casal Almerinda e Gerônimo, encantada pelas águas do rio Emojá desde criança. Marina nasceu e viveu na Ladeira da Saudade, comunidade preta localizada na cidade de Emojá, até os 18 anos. O mundo de Mar é um mundo cheio de águas, tanto quanto a barriga de sua mãe Fernanda quando grávida. Marina é infância e juventude de muitas outras Marinas negras espalhadas pelo Brasil. Sempre achei que a experiência mais incrível nas leituras era a oportunidade de me deslocar para a narrativa como uma observadora participante. Fazer amizade com as personagens, amar e antipatizar conforme os brindes que nossas autoras e autores nos dão. Com Mar eu sentei na praça central da Comunidade da Saudade e enquanto lia, via as lidas e as lutas, idas e vindas, ri e me indignei com os amigos e com as famílias que fiz por todo o livro. Conheci o Centro Comunitário Luisa Mahin, a lucidez anticapitalista de Almerinda, as viagens de Gilmar e de Kiko, a chegada da leveza de Jana e da infeliz exploração e humilhação no trabalho doméstico na casa da patroa da mãe, assisti o lançamento do documentário “Água potável da Saudade” e toda a busca daquela comunidade negra por dignidade e para seu bem viver. Mas como na vida nem tudo é poesia, Marina nos relembra que em tempos difíceis, Olhar o rio, talvez ajude. Travessias são sempre desafiadoras e apesar das saudades que o rio trazia, Marina atravessou o rio e foi viver perto do mar. Parece que a gente é obrigada a não dizer adeus! Suspirava em meio às lembranças das coisas inesquecíveis. Decidiu estudar Letras na Universidade pública em Cidade da Esperança. Chegou com aquele sorriso escancarado típico das pessoas que resistem e nessa caminhada encontrou Santiago, amigo fiel na poesia, na música e no mar. Emocionar é “provocar emoção em” traduz o dicionário Aurélio. Emocionar é a ação provocada pela professora Mônica Conrado nesta sua primeira aventura literária. Com ela passeamos nas memórias de Marina e, com certeza, muitas dessas memórias também se cruzam com as nossas próprias. Isso porque a leitura flui quase ininterrupta não fossem os afazeres diários, terminei o livro com o sentimento de que ninguém é feliz sozinha, nem Marina, nem nós. Lê-lo foi sem sombra de dúvidas um bálsamo em meio a tanto cansaço físico e emocional neste ano de 2020. Eu realmente convido vocês a essa partilha, a esse encontro. Literatura é conhecimento. Conhecimento é alimento. Atraquei no porto, entrelacei minhas pernas à árvore centenária de Saudade e de lá acompanhei Marina. Já sinto saudades. Saudade do que a gente não esquece. Este é o primeiro romance de Mônica Conrado, conhecida por sua trajetória nos estudos e escritas da negritude amazônica e pela prática docente na Universidade Federal do Pará, onde também coordena o Grupo de Estudos e Pesquisa Nós Mulheres: Pela Equidade de Gênero Étnico-Racial desde o ano de 2008. Sinto-me honrada pelo convite e confiança para ler a obra antes de seu lançamento junto a uma confiável plêiade de intelectuais do tamanho de Zélia Amador de Deus que o prefacia tão docemente. Também presenteada com a condução pelos rastros que nos navegam nesse rio-mar de Marina. Desejo igual sucesso no já adiantado segundo livro e no terceiro livro que já começou a nascer. Que sua literatura seja semente fundamental para que muitas das nossas e dos nossos se (re)encontrem e ao mesmo sintam-se encorajadas para escrever suas histórias. Que você siga nos inspirando! Adupé! 

Serviço: Meu Mundo! Eu, rio e Mar é disponibilizado em formato de e-book, com download gratuito pelo link lançado no Webinário Amazônia Negra: imagens, narrativas e saberes em diálogo, que acontece pela Universidade Federal do Pará em formato inteiramente virtual, nos dias 08, 09 e 10 de dezembro de 2020. As inscrições são gratuitas e podem ser feitas aqui!

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