Vista a partir da sua potencialidade para pensar o presente, a História da Arte se desvela como uma coexistência de tempos. É constituída de fragmentos e vestígios, como imagens e gestos do passado que atravessam por brechas e irrompem, no agora, com novos sentidos. Em suas diferentes temporalidades, os historiadores e os artistas se apropriam dessas imagens para a construção de novas narrativas, ao passo que são atravessados pelos seus próprios gestos de (re)apropriação.
É a partir do século XX que significativa atenção se volta às práticas de reapropriação como instrumentos de subversão das histórias oficiais. Reusos tornaram-se uma ferramenta de destaque desde as vanguardas históricas. Os papiers collés cubistas rompiam o isolamento do plano pictórico, e o collage surrealista fazia da reconfiguração de imagens uma porta para o indizível. O ready-made dadaísta, por sua vez, lograva subverter de uma só vez o lugar social dos objetos e as convenções sociais da arte. Esses aprendizados foram recobrados pelas novas vanguardas do pós-guerra, das maneiras mais diversas. Arte pop, novo realismo, arte conceitual, todas essas variantes apresentaram suas releituras do ready-made. Em uma chave mais abertamente politizada, o détournement situacionista, propunha o “desvios” de "elementos estéticos pré-fabricados" para contestar as ideias de propriedade intelectual e o fetichismo da cultura. Com isso, abriam caminho para que essas ferramentas de ressignificação deixassem o campo estrito da arte de vanguarda e se tornassem instrumentos estético-políticos dos movimentos sociais renovados pela contracultura - como nos movimentos feministas e LGBTQIA+, os filmes de arquivo, ou found footage, com a montagem fílmica sendo usada para corromper e promover rupturas em imagens patriarcais e heteronormativas, dando voz a narrativas marginalizadas.
No agora, as rupturas se fazem necessárias no campo das narrativas historiográficas oficiais que moldaram uma única História da Arte. À luz dos estudos decoloniais, ao pensar-se em apropriações, questiona-se as práticas coloniais exercidas pela branquitude no ontem e no hoje. Nas souvenir arts, o sequestro de materiais e objetos dos “novos mundos” como peças colecionáveis materializavam a experiência do exótico, principalmente na Europa dos séculos XVII, XVIII e XIX. Neste contexto, a concepção da Arte encontrou-se impregnada por padrões de dominação e exotização, com concepções eurocêntricas de ordem e classificação - como visto nos Wunderkammern, ou gabinetes de curiosidades, coleções aristocráticas de objetos considerados “exóticos” que contribuiam para a legitimação e reforço de poderes coloniais. Esses e outros roubos culturais impostos pelo imperialismo nas populações negras e indígenas reverberam em como se contesta e em como se procura inverter os sentidos em volta da ideia de “apropriação”, ou ainda, de “ressignificação” no tempo presente.
Num esforço para reescrever o curso da história da arte, os artistas recorrem à reapropriação de discursos, imagens, arquivos, materiais e práticas como meio de reestruturar a memória e a identidade de grupos frequentemente excluídos de narrativas convencionais. Nas obras de Rosana Paulino e Denilson Baniwa, a potencialidade do reuso das imagens aparece no deslizamento de seus significados, a partir da transformação de arquivos coloniais. Com Daiara Tukano, a apropriação das técnicas não-indígenas (TNI) destaca-se como possibilidade de decolonização artística, em um movimento de recodificação da prática como discurso e de reantropofagia. Na obra “Carta ao Velho Mundo” (2018/2019) de Jaider Esbell, com a superposição de mensagens políticas sobre obras clássicas no livro “Galleria Della Pittura Universal”, a apropriação do cânone é um lembrete: o velho mundo está morrendo, levando consigo suas formas dominantes de representação. Nestes gestos, os artistas invertem o sentido colonial das práticas de apropriação que foram e são utilizadas pela branquitude e reinventam suas próprias formas de (re)apropriação a partir da sua potencialidade de reescrita.
Impulsionados por estas e tantas outras questões, os discentes da Pós-Graduação em História da Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP) convidam para o XVIII Encontro de História da Arte (EHA), que este ano será um espaço de reflexão sobre as múltiplas formas de romper, desviar, ressignificar, e reescrever a História da Arte. Com o tema “Reapropriar e Reescrever”, a edição trará mesas, conferências e apresentações de trabalhos que se relacionam às interfaces e potencialidades crítico-epistêmicas da Arte enquanto instrumento de subversão, renovação e reinvenção constante.
Etapa 1:
Inscrições de propostas de comunicação: 10/06/2024 a 16/06/2024
Etapa 2:
Divulgação dos trabalhos aprovados: 20/07/2024
Etapa 3:
Pagamento da taxa de participação para aprovados: 21/07/2024 a 31/07/2024
Etapa 4:
Divulgação da programação de palestras: 21/08/2024
Etapa 5:
Início da inscrição de ouvintes: 21/08/2024
Etapa 6:
Divulgação da programação provisória das mesas de comunicação: 21/08/2024
Etapa 7:
Divulgação da programação definitiva do evento: 07/09/2024
Etapa 8:
Realização do evento: 07/10/2024 a 11/10/2024
Etapa 9:
Entrega do texto para publicação: 31/01/2024
O cronograma de atividades está sujeito à modificações, que serão divulgadas através das redes sociais do evento.
Os interessados em apresentar trabalho nas mesas de comunicação devem preencher o Formulário Google (a ser divulgado no site e nas redes sociais do evento), a fim de serem avaliados pela comissão organizadora, observando o período de inscrição.
É permitido o envio de até uma proposta de comunicação. Trabalhos em coautoria são permitidos desde que correspondam à efetiva participação das partes.
A submissão pedirá:
- Resumo da proposta de comunicação (entre 300 e 400 palavras)
Espera-se um texto sintético que contenha: o objeto/tema da pesquisa e o eventual recorte espacial e cronológico estabelecido (O quê? Quando? Onde?); a problemática, os objetivos e/ou a justificativa para desenvolvimento do trabalho (Qual a pergunta que move o seu trabalho? Por que ela merece atenção?); a forma como você pretende alcançar seus objetivos e as fontes e/ou referenciais teóricos que serão empregados (Como você vai fazer isso?).
- Referências Bibliográficas (entre 3 e 5)
- Palavras-chave (entre 3 e 5)
Público Alvo:
Profissionais ligados ao campo da História da Arte, História Cultural e do Patrimônio, Midialogia, Comunicação, Cinema, Cultura Visual e demais áreas afins, incluindo professores e alunos de cursos de graduação e pós-graduação, pesquisadores, profissionais de museus, arquivos, bibliotecas, serviços de patrimônio, centros culturais e outras instituições.
As comunicações não precisam necessariamente ser sobre o tema do evento. As propostas podem ser relacionadas a todas as questões da História da Arte. Os eixos temáticos das mesas de comunicação serão definidos depois, de acordo com as comunicações aprovadas.